terça-feira, 7 de maio de 2013

Porque os “três grandes” não regressam ao ciclismo?

Tema já abordado mas sempre pertinente, uma vez que a maioria dos agentes do ciclismo nacional tenta caminhar para a frente olhando para trás e que, cada vez que há eleições para Benfica e Sporting aparecem candidatos a prometer o regresso ao ciclismo. Será que Benfica, FC Porto ou Sporting voltarão a ter equipa de ciclismo a curto prazo?

Um dos maiores problemas que identifico no ciclismo nacional é a falta de vontade de se adaptar ao presente (presente de Portugal e do Mundo). Outro é a tendência em caminhar para a frente olhando sempre para trás, chorando um passado que não volta. É necessário perspetivar o futuro e tentar perceber como nos podemos posicionar nele e no presente. Um dos poucos homens do ciclismo português que tem tido uma postura aberta à mudança é Carlos Pereira, que venceu a Volta a Portugal do ano passado, tem a equipa mais forte este ano e além de ser diretor desportivo da Efapel-Glassdrive tem várias empresas relacionadas com o ciclismo. Não é o único bom exemplo, mas é dos poucos. No lado oposto, temos pessoas que continuam a defender que o ciclismo nacional deveria ser apenas para equipas nacionais e continuam à espera do regresso do Benfica, FC Porto e Sporting.

Os clubes desportivos mudaram a sua forma de estar no desporto. Se antes ambicionavam colecionar o maior número de vitórias no maior número de modalidades, hoje dedicam-se a contratar futebolistas estrangeiros na tentativa de os vender a preço superior um ou dois anos depois. Umas vezes com sucesso, outras com enormes fracassos, acumulam-se os prejuízos até níveis que só são suportáveis num país cego. Um país em que os bancos não emprestam dinheiro para a criação de empresas e emprego mas continuam a engordar os passivos dos clubes de futebol, esperando o dia em que as dívidas serão pagas por magia. O motivo desta postura por parte dos clubes é de difícil compreensão, a não ser através da teoria de que presidentes e treinadores recebem comissões por baixo da mesa por cada negócio que aprovam, contratando sul-americanos às dúzias em cada defeso.

Às modalidades, as direções exigem que cada uma delas seja financeiramente autónoma. Cada uma tem que gerar o seu lucro ou pelo menos pagar as suas despesas, porque para dar prejuízo já basta o futebol. Logo aí, está excluída a possibilidade de Benfica, FC Porto ou Sporting regressarem ao ciclismo por conta própria. Não há bilheteiras e as únicas receitas são através dos patrocinadores.

Os últimos dois projetos a envolver estes clubes correram mal. Em 2007 a Lagos Sport criou a Lagos Bike, empresa que geriria a equipa de ciclismo do Benfica. Quem leu o artigo Como estão estruturadas as grandesequipas – Parte I compreenderá melhor o projeto da Lagos Sport. Os objetivos seriam dois. Em primeiro lugar, a Lagos Bike angariar patrocínios suficientes para cobrir os encargos (entre 1,5 e 2 milhões) e, se possível, gerar lucro. Em segundo lugar, com o regresso do Benfica ao ciclismo, a Lagos Sport esperava aumentar o interesse pela Volta a Portugal e atrair mais gente às estradas (o que foi conseguido). Esse aumento de interesse refletir-se-ia nas receitas provenientes de patrocínios à prova rainha do ciclismo português mas também nas restantes provas da PAD: Volta ao Distrito de Santarem, GP Parede Rota dos Móveis e GP CTT Correios.

Rivais e amigos, José Maria Nicolau e Alfredo Trindade
Ainda que não tenha vencido a Volta a Portugal em nenhum dos dois anos que esteve na estrada (o melhor foi o 3º lugar de Ruben Plaza em 2008), o principal problema não foi desportivo mas sim empresarial. A Lagos Bike nunca conseguiu patrocínios suficientes para cobrir as despesas da equipa e o projeto de cinco anos terminou ao fim de dois, com salários em atraso.

O outro projeto a envolver um dos três grandes foi a equipa sub-23 do Sporting, que durou apenas um ano e, até onde sei, apenas pagou o primeiro mês de salários.

Porque nenhum dos projetos teve sucesso? Não adianta tentar voltar ao passado, mas dele podemos tirar algumas lições.

Atualmente bastam 300 mil euros (ou talvez 200 mil) para ser patrocinador principal de uma equipa candidata à vitória na Volta à Portugal, desde que os responsáveis desportivos da equipa saibam quem contratar e como negociar. Ainda que possa parecer um valor elevado, é significativamente inferior a 2007 ou 2008, quando o Benfica tinha um orçamento entre os 1,5 e 2 milhões de euros, a Liberty Seguros 1 milhão, a LA-MSS também perto de 1 milhão e a Palmeiras Resort-Tavira cerca de 800 mil euros.

Mesmo estando associado a um dos três grandes, os tais 300 mil euros seriam suficientes para fazer uma grande equipa (“grande” no contexto nacional) e estar associado a um dos três grande tem um grande poder de influência sobre os seus adeptos. Porém, também tem um efeito contrário nos adeptos mais fanáticos dos clubes rivais, ou, se preferirmos, nos adeptos dos três maiores clubes de Portugal: o anti-Benfica, o anti-FC Porto e o anti-Sporting.

Ainda assim, o maior motivo de afastamento entre os possíveis patrocinadores e uma possível equipa dos três grandes é a canibalização que o nome Benfica, FC Porto ou Sporting têm perante tudo o que está em seu redor. A Sagres Zer0 chegou a associar-se à equipa do Benfica em 2007 mas o contrato de cinco anos foi rescindido ao fim de sete meses, pois aos olhos dos adeptos e da comunicação social a equipa era apenas o Benfica.

É altamente penalizador para qualquer patrocinador ver que as restantes equipas são tratadas pela comunicação social pelo nome dos seus patrocinadores e que a “sua” equipa é tratada como Benfica, FC Porto ou Sporting. Veja-se o caso da Volta a Portugal do ano passado. As empresas Efapel e Glassdrive conseguiram um fantástico protagonismo pela prestação da sua equipa, um protagonismo muito superior ao que teriam se patrocinassem uma Efapel-Benfica ou Glassdrive-Benfica, pois nesse caso o nome Benfica seria sempre o mais destacado.

Convencer a comunicação social a tratar as equipas pelo nome dos seus patrocinadores? Essa é uma guerra antiga dos diretores desportivos inteligentes, que não gostam de ver as suas equipas tratadas pelo nome do clube, da cidade onde têm sede ou da abreviatura UCI. Esses diretores desportivos, os inteligentes, conhecem a importância de dar retorno aos seus patrocinadores. No entanto, os jornais são escritos para o grande público que os compra, não para os patrocinadores das equipas, e como tal utiliza os nomes com os quais melhor se identifica o seu público.

Conclusão

Não é de todo impossível que um dos três grandes do futebol português regresse ao ciclismo. Ainda assim, é pouco provável que o faça nos próximos anos, pois além dos aspetos contrários já citados existe a crise económica a retrair o consumo privado e o investimento das empresas em publicidade e outras ações de marketing. As suas consequências não se refletem apenas no ciclismo mas sim em todas as modalidades para além do futebol, a única que tem transmissão em horário nobre.

A curto prazo, o regresso de um dos três grandes ao ciclismo é, sobretudo, campanha eleitoral.

9 comentários:

  1. concordo com muitos dos pontos neste texto todavia existem pontos falsos como o Futebol dar prejuízo ,isso não é verdade o Benfica teve um lucro de 22 milhões de euros no segundo semestre de 2012, o FC Porto também teve um lucro considerável e o Sporting Clube de Portugal esse sim teve um prejuízo(enorme diga se de passagem) de quase 21 milhões de euros no segundo semestre de 2012 e ainda o caso do Benfica é diferente porque ao contrario dos outros clubes nacionais o Benfica é o único que continua a apostar na modalidades

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Tacfer, tiveram lucro mas continuam a acumular grandes passivos, poucos são os semestres em que os clubes portugueses têm apresentado lucro, mas isso são outros quinhentos.

      Eliminar
  2. Obrigado pelo comentário, Tacfer.

    Aproveito para partilhar esta notícia que fala dos prejuízos das SADs dos três grandes na última época:
    http://www.jn.pt/paginainicial/interior.aspx?content_id=1250300

    Partilho também este onde, além de referir o prejuízo da SAD do Benfica no último ano, refere nos últimos três: http://www.publico.pt/noticia/benfica-fechou-epoca-passada-com-prejuizo-de-117-milhoes-de-euros-1563765

    De referir que as SADs não são os clubes. No entanto, se as SADs gerassem lucro, poderiam distribui-los pelos acionistas, entre os quais os clubes.

    De qualquer forma, esse está longe de ser o assunto mais relevante da crónica.

    Cumprimentos!

    ResponderEliminar
  3. O regresso no futuro de um grande ao ciclismo nacional, dependerá em grande parte, eu diria uns 80%, de uma coisa chamada “o clube controlar o que não deve”, acho que me fiz entender? É que os clubes gostam de todas as vantagens e no ciclismo não dá para os jogadores estarem "lesionados durante uns tempos, com algo que não é grave mas não passa, e por isso treinam à parte" , acho que já me fiz entender o suficiente.

    Contudo o problema de canibalismo do nome é muito grave, e difícil de ultrapassar, o senhor Luís Almeida não consegue que durante a Volta a Portugal, chamem LA Alumínios-Antarte, e não LA-Antarte ou Paredes, por isso é quase impossível que um meio de comunicação vá em algum momento chamar Loja do Tio Chico-Sporting, em vez de Sporting.

    Na minha ótica só há duas alternativas, uma era as equipas entravam com um orçamento de 300000€ (Orçamento normal em Portugal) e criavam uma equipa continental em que uma boa parte deste valor fosse suportado pelo Fc porto ou Benfica ou Sporting, e a eles se juntassem outros patrocinadores sem o objetivo de serem principais, mas que completassem o orçamento, aqui só veria sucesso se eventualmente fosse um patrocinador delonga data do clube, e que não fizesse questão de ter o nome em primeiro lugar, orçando também em função disso, para esta "maneira" só vejo possível se fosse FC Porto e Revigrés, com os grande de Lisboa de modo algum me parece possível!

    Outra e que ficava muito bem até, entre os três grandes, era à sua conta, ou praticamente, claro que alguns patrocinadores surgiriam sempre (bicicletas, automóveis todos já tem era só estender, equipamentos, bem falado era idem aspas, e mais alguns haveriam de aparecer) e os três reforçarem o pelotão sub 23, ajudavam muitos jovens, e uma modalidade, a bem do desporto, e seguindo alguns dos bons exemplos que há neste campo, noutras modalidades, e no futebol também.

    Melhores cumprimentos

    ResponderEliminar
  4. Um dos artigos é de 2009 todavia isso não importa nada porque o que interessa
    é o ciclismo e não o futebol

    ResponderEliminar
  5. Realmente é verdade Tacfer. Vi as datas de um e nem reparei no outro ;)

    ResponderEliminar
  6. Grande documentário! podiam também passar estes textos para sistema informático, pois tenho a certeza que existem muitas pessoas interessadas por ciclismo que tem preguiça de ler tanta coisa xD

    ResponderEliminar
  7. Parabéns Rui pelo excelente post, realmente tenho muita pena de não ver os três grandes no ciclismo, mas como disse "hoje dedicam-se a contratar futebolistas estrangeiros na tentativa de os vender a preço superior um ou dois anos depois. Umas vezes com sucesso, outras com enormes fracassos" -> FRASE GENIAL...mas é país que temos...já agora uma dúvida, sabe se outras potencias como Real, Barcelona e assim, já tiveram equipas de ciclismo??

    Abraço
    Ricardo Costa

    ResponderEliminar
  8. Obrigado pelos comentários!

    Pergunta, os textos já está em formato informático: texto (passo a redundância). Noutro formato... talvez um dia. Para já, só mesmo lendo.

    Anónimo, o Barcelona e o Real Madrid tiveram equipas nalguns anos das décadas de 20, 30 e 40. O Barcelona teve equipa amadora em 2004.

    Cumprimentos!

    ResponderEliminar

Share