sábado, 29 de junho de 2013

100 anos de Tour não previnem estas situações

E agora?
Era uma etapa com traçado à medida dos sprinters mas acabou marcada por uma grande queda já na fase de lançamento do sprint e por um autocarro encalhado na meta, que só nos últimos minutos conseguiu deixar a estrada desimpedida. A experiência de 100 anos de Volta a França não bastou para impedir esta situação. De quem é a culpa?

Os problemas começaram quando o autocarro da Orica-GreenEdge ficou encalhado e se começou a perspetivar que não o conseguiriam remover antes da chegada do pelotão. Foi atribuída à GreenEdge uma multa de 2000 francos suíços (1600 euros) mas parece que a culpa não terá sido da equipa, pelo menos não na totalidade. Se o motorista foi autorizado a passar ali, então quem lhe concedeu a autorização também tem responsabilidades. E uma vez que o autocarro é o mesmo desde que a equipa se formou (janeiro do ano passado) e já esteve no Tour 2012, então também poderá haver responsabilidades por parte de quem montou a estrutura da meta.

Faltando menos de dez quilómetros para a meta inicialmente prevista, o colégio de comissários decidiu antecipar o final em 3 km, numa decisão nada fácil, até pelo pouco tempo que tinham. A decisão foi comunicada às equipas.

Aqui convém explicar que nas provas World Tour existe comunicação entre os carros de apoio e os ciclistas através dos famosos auriculares. Recebendo a notícia, cabia aos diretores desportivos comunicar aos seus ciclista e causa estranheza que Kittel diga que não sabia do incidente do autocarro.

Ou houve um problema dentro da Argos e não receberam a comunicação do rádio-volta (o que é pouco provável) ou não a comunicaram aos ciclistas até perceber o que se passaria realmente.

Greg Henderson, peça fundamental do comboio de Andre Greipel na Lotto, explicou através do Twitter: "A 6 quilómetros da meta disseram-nos que a marca dos 3 quilómetros seria o final. Preparamos o sprint com 3 homens. A 3,5 km disseram-nos que o final seria o original."

De quem é a culpa? Muitas vezes as organizações colocam os ciclistas em estradas sem condições e parece que vai ser o caso na descida do Alpe d'Huez na 18ª etapa. No entanto, esta queda deu-se num local com todas as condições para a passagem do pelotão e as responsabilidades da mesma não podem ser atribuídas a quem traçou e sinalizou o percurso. Aqui a culpa parece ser da própria dimensão do Tour. Passo a explicar.

O Tour tem 198 ciclistas à partida e são 198 ciclistas que se prepararam para estar bem nestas três semanas. Mesmo aqueles que fizeram as clássicas ou o Giro e aqueles que farão a Vuelta, ninguém vai ao Tour apenas por ir. Ou se vai com grandes objetivos pessoais, ou se vai para ajudar os colegas, ou fica-se de fora para preparar outras provas, como são os casos de Cancellara e Boonen.

A etapa de hoje tinha como principais favoritos Cavendish, Greipel, Sagan e o próprio Kittel, mas no total havia mais de vinte ciclistas que queriam disputar o sprint, muitos deles apenas para um 10º lugar que lhes desse algum protagonismo a eles e à equipa. Além disso, a cinco quilómetros da meta todos os sprinters têm um ou dois homens a trabalhar na sua colocação e os grandes favoritos como Cav, Greipel, Sagan ou Kittel têm mais do que isso, talvez três ou quatro equipiers a lutar pela melhor colocação.

Além dos sprinters, o Tour tem também 30 ou 40 ciclistas com ambições para a classificação geral. Pode parecer exagerado, mas vejamos bem. Se há pelo menos 7 ciclistas a falarem nos três lugares de pódio (Froome, Contador, Evans, Valverde, Rodríguez, Porte e Van Den Broeck), quantos haverá para os dez/quinze primeiros lugares? Olhando para a lista de participantes e contando aqueles que têm esse objetivo, anda mesmo entre as três e quatro dezenas de ciclistas. A estes, juntem-se os seus gregários, os roladores que tentam a todo o custo colocar os seus líderes o mais à frente possível.

A busca pela melhor colocação possível é uma guerra muito intensa e só acalma com o passar dos dias, quando alguns ciclistas começam a acusar o desgaste as etapas anteriores ou começam a ver que não têm hipóteses de cumprir os seus objetivos iniciais e passam a poupar-se nestes finais para apostar tudo numa fuga que os leve à glória.


Consequências

O colégio de comissários acabou por atribuir o mesmo tempo a todos os ciclistas, a decisão certa. Afinal de contas, quando se deu a queda já estavam nos últimos seis quilómetros para a meta original, o que significa que estavam dentro dos últimos três quilómetros em relação à meta revista. As consequências foram ao nível físico.

Apesar de muitos ciclistas terem caído, poucos tiveram consequências graves. O pior de todos é Tony Martin, mas para já não há nenhum abandono anunciado. Para a maioria foi apenas chapa e pintura.

Para terminar, ficam algumas questões para reflexão. Todos vimos que o problema do autocarro apenas foi resolvido poucos minutos antes da chegada dos ciclistas. Neste caso, tinham comunicação com os carros de apoio, mas estas apenas existem nas provas World Tour. Nas restantes provas, vendo os ciclistas a aproximar e a meta impedida, o que poderiam fazer os comissários e a organização? Não precisa de ser um autocarro, mas podemos pensar em qualquer tipo de problema de última hora. Como se avisa os ciclista, como se pára um pelotão a 60 km/h e como se impede que... sprintem contra um obstáculo? Será que vale a pena correr os riscos apenas porque, supostamente, a ausência de comunicações com os diretores desportivos tornam as corridas mais abertas e interessantes?

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3 comentários:

  1. Apesar destas quedas já começarem a ser habituais e terem na sua origem as causas que referiste penso que aqui a organização também contribuiu para isso, pois alterar novamente o final quando se estava já nos últimos três quilómetros do suposto final deve ter causado alguma surpresa e indefinição nos ciclistas da frente sobre o que fazer.

    Relativamente a este problema das quedas constantes nas primeiras etapas penso que está na altura da UCI alargar a tomada de tempos para lá dos 3 km, pois se dantes os sprints eram lançados já perto da meta, e poucas eram as equipas com verdadeiros comboios, hoje são várias e o trabalho de lançamento começa muito mais longe da meta.

    Quanto aos problema do rádio pode ser resolvido pela utilização de auriculares mas com frequência restringida, algo que eu penso que acontece em algumas provas.

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  2. Os auriculares são segurança, quem achar que não só está a pensar no ciclismo como força bruta que era à uns anos atrás...

    Rui dizes que é chapa, mas olha que deverás concordar comigo que Tony Martin tinha 1 encontro quase certo com 1 vitória de etapa que duvido que o vá conseguir! Mesmo as mazelas em Sagan, Contador e mesmo no Rui Costa não sei que estragos não vão provocar já na 2ª etapa, perigosa como ela é!

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  3. Obrigado pelos comentários.

    Rapior, apenas um reparo. Quem toma a decisão de alterar o final da etapa é o colégio de comissários, não a organização.
    Os auriculares são permitidos a todos os ciclistas nas provas World Tour e totalmente proibidos nas restantes, exceto contrarrelógio (aí são permitidos).

    Luís Caldas, eu disse que para a maioria dos que caíram era chapa a pintura. Não disse que era para todos.

    Cumprimentos!

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