sábado, 6 de julho de 2013

Nairo

Confesso: hoje (pela primeira vez) fujo ao tema quente de forma propositada. A vitória de Chris Froome secundado de Richie Porte causou controvérsia nesta maravilha que é a internet e que faz que qualquer um de nós consiga dizer (quase) tudo o que lhe passar na cabeça para quem o quiser ler ou ouvir. Prefiro falar de Nairo Quintana.

Tudo aquilo que possa escrever sobre Froome, Porte e a Sky iria gerar debate e discussão na caixa de comentários. Iria também gerar muitas visualizações, bem sei. Quanto mais polémico for o tema, quanto mais controverso, quanta mais discussão gerar, mais audiência tem. Isso é uma questão dos canais televisivos, dos jornais e de quem está dependente da audiência para ter receitas. Não sinto necessidade de atacar ou defender Froome e a Sky hoje. Hoje prefiro falar de Nairo Quintana.

Quintana representa muito. Saído de um país que está muito atrasado relativamente aos países de quase todas a grandes figuras do ciclismo mundial (maioritariamente europeu, norte-americano e australiano) e filho de uma família pobre até para o contexto colombiano. Ainda assim, Quintana vem de uma Colômbia que ama ciclismo e os seus ciclistas.

Filho de camponeses, Nairo não começou a pegar na bicicleta para ser ciclista ou por lazer, mas sim para ter acesso a algo tão básico e fundamental como a educação, pois a escola mais próxima ficava a vinte quilómetros de distância e os pais não tinham condições de pagar transportes. Pedalava sem ídolos e ignorando as histórias de Lucho Herrera e Fabio Parra, Escarabajos que então já tinham terminado carreira. Pensava entrar no Exército Nacional Colombiano para garantir o seu sustento e escapar às dificuldades com que sobrevivem os camponeses na sua região.

Sem condições para lhe pagar as inscrições em provas, o pai desenvolveu um plano: pagaria a inscrição no final, com o dinheiro do prémio. Assim começou no ciclismo, e quanto mais tempo passava, mais o ciclismo se parecia um escape à pobreza para a família Quintana. O pai fez um pé-de-meia para lhe comprar uma bicicleta melhor, em 2009 (19 anos) assinou o seu primeiro contrato profissional com a equipa Boyacá es para Vivirla e nesse mesmo ano disputou os Mundiais do seu escalão.

Em 2010 Quintana foi selecionado para a Volta a França do Futuro. Começou por levar cotoveladas e encontrões de europeus e norte-americanos que achavam que o pequeno colombiano não sabia andar de bicicleta. Saiu de lá com a vitória, quase com dois minutos de  vantagem sobre o segundo, e em 2012 veio para a Europa, onde ganha uma fortuna para o meio de onde veio. E muito do que ganha é para a família. Para o pai que não pode fazer grande esforços físicos e para a mãe que já não precisa de fazer dois quilómetros para ir lavar a roupa ao riacho, porque Nairo lhe comprou uma máquina de lavar, uma das maiores conquistas da sua ainda curta carreira.
Na chegada à Colômbia depois de vencer a Volta a França do Futuro
No ano passado chegou à Movistar, venceu a etapa rainha do Critérium du Dauphiné e foi o melhor apoio que Valverde teve na montanha. Este ano venceu a Volta ao País Basco, uma etapa na Catalunha (4º na geral) e no Paris-Nice apenas falhou o pódio por uma queda. Nestes dois anos já se mostrou um bom contrarrelogista, muito bom tecnicamente, com excelente leitura de corrida e uma capacidade para subir montanhas fora do vulgar. É um dos melhores trepadores da atualidade.

Hoje saiu do pelotão ainda na subida para o Col de Pailhères com uma facilidade impressionante, ganhando um minuto ao grupo comandado pela Sky. Infelizmente para ele, nada pôde fazer na descida, quase toda ela muito rápida e onde a sua falta de peso esteve contra si. Chegou ao início da subida final com o grupo de favoritos logo atrás de si, mas não se rendeu como Pierre Rolland. Atitude de campeão e lá foi ele, voltando a ganhar tempo. Quando Froome atacou, ainda tentou seguir o britânico, mas o ataque para Pailhères passou fatura. Fica alguma frustração pelos quarenta segundos perdidos a descer, mas o ciclismo é assim. A leveza a subir é um fardo pesado a descer (salvo seja).

Está com a camisola branca, é oitavo na geral e pode lutar por mais do que isso. A facilidade com que ataca nas montanhas é algo de fantástico. Do melhor que o ciclismo tem para nos oferecer!
No Tour, de branco

2 comentários:

  1. antes de mais quando vejo uma foto do Nairo vem logo a cabeça a imagem de um "índio"... :)

    as suas origens, ou seja, altitude da sua terra natal + dificuldades familiares, são sem duvida 2 grandes vantagens perante os seus adversários (nascidos num berço de "ouro" ao nível do mar)

    apesar de estar neste Tour para aprender, poderá já este ano dar uma grande "dor de cabeça" a muitas equipas devido a suas excelentes capacidades como trepador.


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  2. Uma coisa, este rapaz é fenomenal porque ele quando era bebé teve bastante problemas, acho que teve várias vezes perto da morte. Eu digo isto porque gosto da Movistar, se eles quisessem disputar o Tour trabalhavam para o Quintana. Este menino se tivesse o que o Valverde tem estava hoje no 2º lugar a menos de 30s do Froome. Mas como vai trabalhar para o Valverde levavam-no para a Vuelta que saía de lá com a Roja !

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