sábado, 28 de março de 2015

Como se fazem as classificações e os desempates

No último Paris-Nice tivemos três ciclistas empatados para o segundo lugar: Michal Kwiatkowski, Simon Spilak e Rui Costa. Aqui se explica como são feitas as classificações e, quando necessário, os desempates.

Classificação da Televisão?

Uma confusão frequente resulta das classificações (e sobretudo dos tempos) que são apresentados nas transmissões televisivas. É importante compreender que cada organizador contrata a uma empresa o equipamento de classificações (chips para as bicicletas, sensores na linha de meta, etc), equipamento esse que depois é utilizado pelos comissários, que são os juízes das provas de ciclismo. Por sua vez, as cadeias responsáveis pelas transmissões televisivas podem contratar um sistema de classificações ou trabalhar com o contratado pelo organizador, para apresentar as classificações ao longo da transmissão. Assim, poderá a televisão utilizar a classificação da prova (dos comissários) mas estes não precisam nem utilizam a televisão para este efeito.

Um caso bem conhecido dá-se nos contrarrelógios da Volta a Portugal. O sistema contratado pela RTP apresenta todos os anos o mesmo defeito: os ciclistas finalizam o contrarrelógio e o cronómetro continua a contar durante mais alguns segundos. Este problema afeta apenas a transmissão televisiva. A classificação da prova não é afectada. E por muito que algum diretor desportivo queira utilizar os tempos da televisão para temperar as peixaradas habituais servidas no final da etapa, não tem razão. Os tempos oficiais são os dos comissários

Classificação de etapa em linha

Para classificação de cada etapa são contabilizadas as horas, minutos e segundos. Porém, os centésimos são importantes para definir em que grupo é integrado cada ciclista.

Como é do conhecimento geral, numa chegada ao sprint é dado o mesmo tempo a todos os ciclistas que integram o grupo, apesar de naturalmente existir uma diferença de alguns segundos entre o primeiro e o último de um pelotão numeroso. Porém, por vezes, existem cortes. O importante é perceber como se fazem esses cortes, algo que é até simples: existe um corte quando a diferença entre dois ciclistas é superior a um segundo (100 centésimos). Vejamos o seguinte exemplo (com horas, minutos, seguros e centésimos):


Desde Marcel Kittel até Andrea Guardini, não existe nenhuma diferença superior a um segundo, pelo que todos ficam com o mesmo tempo. Entre Guardini e Sacha Modolo existe 1.30 segundos de diferença, pelo que teremos que considerar um corte. Isto é, Modolo já não conta como estando no primeiro grupo (de Kittel), mas sim num segundo grupo, do qual é ele o primeiro ciclista. Neste caso, ser-lhe-á dado o seu tempo real até aos segundos: 4:00:03, mais três segundos que todos os que ficaram à sua frente.

Repare-se que entre Coquard e Farrar, volta a existir uma diferença superior ao segundo (101 centésimos). Como tal, Farrar tem que ser contabilizado noutro grupo, com 4:00:05, perdendo cinco segundos para a frente.

Nota: os arredondamentos são sempre feitos para baixo.

Classificação de etapa de contrarrelógio

A lógica é semelhante às etapas em linha. Para a classificação da etapa disputada em contrarrelógio contam as horas, minutos e segundos.

Os centésimos apenas servem para desempate entre dois ciclistas, seja na etapa, ou na classificação geral, como veremos adiante.

Classificação geral individual

A classificação geral é simples: a soma dos tempos de cada etapa (horas, minutos e segundos), menos as bonificações, mais penalizações (se existirem).

Bonificações

A existência de bonificações é uma opção do organizador da prova, tendo que ser mencionada no regulamento particular desta. No entanto, existem regras da UCI que devem ser respeitadas. Caso o organizador queira fazer diferente do recomendado pela UCI, terá que pedir autorização.

A saber, essas recomendações são:
- Apenas devem existir, no máximo, 3 sprints intermédios com bonificações por etapa; ou um sprint intermédio no caso das meias etapas (duas etapas no mesmo dia);
- Na generalidade das provas, as bonificações devem ser de 10s, 6s e 4s na meta e 3s, 2s e 1s nos sprints intermédios;
- Nas meias etapas deverá ser de 6s, 4s e 2s.
- Nas grandes voltas, o organizador poderá optar pelo sistema de de 20s, 12s e 8s na meta e 6s, 4s e 2s nos sprints intermédios (ou pelo sistema geral).
- Não podem existir bonificações intermédias se não existir bonificação na meta.
- Não existem bonificações em contrarrelógios, individuais ou colectivos (no passado existiram).

Desempate

Pode acontecer que na classificação geral surjam empates de tempo. Isto é, ciclistas que depois de somados os tempos de todas as etapas, descontadas as bonificações e acrescentadas as penalizações (se existirem), tem as mesmas horas, minutos e segundos. Quando assim acontece, é necessário desempatar e para isso existem três critérios de, devidamente ordenados. São os seguintes

1. Centésimos gastos nos contrarrelógios
Se dois ou mais ciclistas estão empatados, é adicionada à sua classificação os centésimos de segundo gastos em contrarrelógios individuais, incluindo prólogo. Foi o que aconteceu recentemente no Paris-Nice. No somatório do prólogo e da cronoescalada do último dia, Kwiatkowski gastou 91 centésimos, Spilak 106 e Rui Costa 142. Por isso Kwiatkowski foi segundo, Spilak terceiro e Rui Costa quarto (o primeiro foi Richie Porte, com menos 30 segundos).

2. Somatório de posições nas etapas
Quando não existem contrarrelógios individuais (ou os centésimos gastos são iguais), são somadas as posições ocupadas nas várias etapas.

Vejamos o seguinte exemplo (fictício), numa prova de quatro etapas em que não há contrarrelógio e os quatro ciclistas em causa ficam todos com o mesmo tempo.

Somados as posições ocupadas em cada etapa, Marcel Kittel tem 10 "pontos", Peter Sagan 12, Arnaud Démare 12 e Rojas 16. Kittel vence após desempate, Sagan e Démare continuam empatados, Rojas é quarto.

(Atenção: não confundir estes "pontos" com a classificação por pontos).

3. Posição na última etapa
Se ainda assim permanecer o empate, como acontece no exemplo fictício apresentado entre Sagan e Démare, é aplicado um terceiro critério: quem ficou melhor posicionado na última etapa. Neste caso, Sagan ficou melhor posicionado que Démare.

Em suma...

O processo é simples, desde que se conheça as regras. Espero que este artigo tenha sido útil nesse sentido.

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