quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Radioshack/Leopard, a criação de uma super equipa?

Do que falariam Frank Schleck e Andreas Klöden?
Confirmada a fusão entre duas equipas tão poderosas e que no seu total têm cinco corredores portugueses, um director desportivo, um mecânico e um director técnico, não poderia ignorar este tema. A Radioshack-Nissan-Trek (ou RadioSchleck) poderá mesmo tornar-se uma das equipas mais marcantes do ciclismo moderno.



A pesada herança de Armstrong

Atendendo ao fracasso que foi para eles o Tour, e que a política de contratações que estava a ser seguida pela Radioshack perspectivava um novo fracasso para 2012, planeava eu lançar a minha análise ao futuro da equipa quando terminasse a Vuelta. Porém a anunciada fusão entre a equipa da Bruyneel e a Leopard faz com que eu me antecipe e aborde o futuro dessa/dessas formações já durante a Vuelta (onde, diga-se, a Radioshack volta a estar abaixo das espectativas).

A Radioshack e qualquer equipa de Johan Bruyneel tem a pesada herança de ser sucessora da US Postal. Muito se passou entretanto, mas quando a Discovery Channel terminou, Bruyneel levou grande parte da estrutura para a Astana e depois para a Radioshack, tendo Armstrong corrido em ambas. Por isso, na mente de todos, esta Radioshack é a sucessora da US Postal/Discovery Channel que venceu sete Voltas a França através de Armstrong e uma através de Contador e da Astana com a qual Contador conquistou a sua segunda vitória no Tour (a terceira já foi sem Bruyneel).

Mas a Radioshack está muito distante do nível dos anos de ouro da US Postal. A USP tinha Lance Armstrong, mas também um Roberto Heras que conseguiu vencer uma Vuelta, ser segundo noutra e quarto noutra, um Paolo Savoldelli que venceu um Giro e foi quinto noutro e um Leipheimer que foi terceiro na Vuelta antes de sair da equipa e terceiro no Tour quando regressou, em 2007, então com Contador a vencer e Popovych a ser oitavo. Estes foram os maiores feitos da USP/Discovery em grandes voltas mas a equipa não se resumia a isso. Se lhe juntarmos os resultados de Ekimov, Hincapie, Hoste, Gusev e até mesmo Boonen nas clássicas, vemos que a US Postal foi mais do que Lance Armstrong e o seu comboio azul. Foi sim uma equipa que tinha um grande líder, acompanhado por uma grande equipa, mas com outros corredores que podiam lutar pelos primeiros lugares em grandes voltas e nas grandes clássicas, como Volta a Flandres ou Paris-Roubaix.

Este ano a Radioshack não tinha ninguém que pudesse lutar pelo pódio no Tour e Johan Bruyneel sabia-o. Tinha três homens que poderiam terminar no top-10, Andreas Klöden, Levi Leipheimer e Chris Horner, aos quais juntou Janez Brajkovic e apostou na estratégia de “cada um por si e logo se vê”. Sendo a Volta à Califórnia um dos principais objectivos da equipa (o patrocinador é norte-americano e tem lá os seus interesses), é compreensível que tenham abdicado de levar ao Giro os seus melhores homens para a classificação geral. Poderia ter resguardado algum dos seus melhores voltistas e algum dos seus homens mais rápidos para a Vuelta, mas Bruyneel destacou todos os voltistas para o Tour e os três mais rápidos da equipa (Manuel Cardoso, McEwen e Robert Hunter) para a Volta a Itália. A Volta a Espanha foi utilizada como Plano B e além de cinco ou seis corredores com lugar previamente assegurado (entre eles Machado) o resto seria decidido depois do Tour. Um dos corredores convocados para a Vuelta, por ter visto a sua prestação no Tour prejudicada por quedas (que levaram ao abandono), foi Kloden e o péssimo estado de forma em que o alemão se encontra está visível para todos. Ele nunca enganou ninguém e, apesar do seu director desportivo dizer que seria um dos líderes a par de Brajkovic, Kloden sempre disse que não estava recuperado das mazelas do Tour e apenas poderia ajudar os seus colegas. Esteve em Espanha a ocupar o lugar de outro corredor, sem conseguir ajudar os seus colegas, e desistiu na sexta-feira. A culpa não é dele, mas sim de quem o convocou.

Sim, a culpa é de Bruyneel, o mesmo que escalonou para o Tour uma equipa com demasiados líderes mas sem gregários ao mesmo nível (por exemplo para ajudar Leipheimer quando caiu na primeira semana) e o mesmo que fez os seus três sprinters coincidirem no Tour Down Under, Milano-Sanremo, Volta a Itália, Eneco Tour, Vattenfall Cyclassics e GP Ouest France, para mencionar apenas as provas em que estiveram os três. Sim, o mesmo Bruyneel que venceu 7 Voltas a França como director desportivo de Armstrong e duas como director de Contador, mas este ano tem errado demasiado aos olhos de toda a gente.

2012 para voltar ao topo?

A Radioshack necessitava de uma reformulação para 2012, aproveitando todos os seus corredores com mais potencial, segurando apenas os veteranos que ainda pudessem realmente ser úteis para os objectivos da equipa e contratando um grande corredor que pudesse lutar pelo pódio nas grandes voltas. Tiago Machado, Ben Hermans e Matthew Busche teriam que ficar pelo potencial que têm para provas por etapas, Nelson Oliveira e Jesse Sergent pela capacidade demonstrada em contra-relógios e Michael Kwiatkowski por ser um promissor contra-relogista e sprínter. Porém, dois deles foram os primeiros a anunciar a sua saída da equipa: Kwiatkowski e Ben Hermans, enquanto as duas primeiras renovações anunciadas eram de dois veteranos: Horner e Klöden. Saia Levi Leipheimer mas parecia que a Radioshack continuava com a mesma filosofia, abdicando dos melhores jovens e segurando quem já está na fase descendente da carreira. Porém, houve mudança de planos.

Com a fusão com a Leopard-Trek, está encontrado quem será o grande líder da equipa: Andy Schleck. A Leopard necessitava de patrocinadores, a Radioshack necessitava de corredores que dessem garantias e a fusão entre elas parece benéfica para ambas. A partir de agora, há que começar a construir a equipa, olhando para os objectivos, para quem os poderá alcançar e para quem é necessário em torno dos líderes.

Andy Schleck e Frank Schleck serão as apostas para grandes voltas (os dois para o Tour, como sempre? Veremos), Fabian Cancellara será o homem para as clássicas de pavé e Chris Horner deverá ser o líder para as provas norte-americanas (continuam a ser um grande objectivo, pois o patrocinador continuará a ser o mesmo). Andreas Klöden está seguro na equipa e poderá ser uma aposta para provas de uma semana (este ano ganhou Volta ao País Basco e foi 2º no Paris-Nice) ou para outra grande volta que não o Tour. Matthew Busche e Janez Brajkovic poderão ser dois bons gregários para as provas mais importantes, sem esquecer a evolução do primeiro e a possibilidade de o segundo liderar em provas menores. O sprínter e campeão alemão Robert Wagner e o Nelson Oliveira também estão confirmados, totalizando nove corredores.

Além desses nove nomes confirmados pela Leopard (que continuará a ser a base e proprietária da licença da equipa), após entrevista com Bruyneel o L’Equipe dá como certos Fuglsang e Haimar Zubeldia, que seriam mais dois grandes gregários, o sprínter Daniele Bennati e os jovens Ben King e Jesse Sergent. Markel Irizar já anunciou que renovou contrato por dois anos e também ele fará parte da equipa, Ben Hermans e Gregory Rast, que este ano correram pela Shack, tinham sido anunciados como reforços da Leopard e devem lá continuar, tal como Tony Gallopin e Gianni Meersman que tinham sido anunciados como reforços para a Radioshack. Deste modo estão definidos 19 ciclista de uma equipa que poderá ter um máximo de trinta corredores.

Quando a saídas, o L’Equipe dá como certas as de Brice Feillu, Fabian Wegmann, Thomas Rohregger, Martin Mortensen, Martin Pedersen, Tom Stamsnijer, Anders Lund, Davide Vigano e Bruno Pires (do lado da Leopard) e Sérgio Paulinho e Geoffroy Lequatre (do lado da Radioshack), tendo Feillu e Lequatre confirmado. O’Grady, McEwen e Beppu estão confirmados como reforços da GreenEdge, Rosseler na Garmin, Muravyev na Astana e os já referidos Kwiatkowski e Leipheimer correrá pela Omega Pharma-Quick Step.

Olhando aos corredores com o futuro ainda em aberto, Tiago Machado, Maxime Monfort, Linus Gerdemann e Oliver Zaugg são dos mais interessantes pelo que podem valer em provas de uma semana e pelo apoio que podem dar aos seus líderes na montanha, mas depois da Vuelta que está a fazer não é de excluir a hipótese de Maxime Monfort ambicionar liderar uma equipa (ou pelo menos ter maior liberdade, coisa que até hoje nunca pediu). Tiago Machado também poderá ter interesse em ir para uma equipa que lhe dê maior liberdade, mas o seu empresário só consegue colocar ciclistas em equipas como o Boavista, a CCC-Polsat ou a Burgos 2016 (sem Azevedo, em vez de quatro portugueses na Shack talvez estivesse apenas um, porque ter qualidade não é suficiente). O Jens Voigt também deverá interessar à equipa se optar por continuar carreira e o jovem Giacomo Nizzolo (22 anos) poderá ser uma das apostas para o sprint, pois já demonstrou que pode tornar-se num dos melhores velocistas do mundo.

Com os 19 corredores já confirmados e mais 3 ou 4 que saiam do lote agora referido, a Radioshack-Nissan-Trek (assim está previsto quês e chame) terá uma grande equipa para as grandes provas e para as provas de uma semana, faltando apenas reforçar o plantel para as clássicas, onde Fabian Cancellara necessitará de melhor apoio do que o que teve este ano.

Com a permanência de Nelson Oliveira segura e a de Tiago Machado em aberto pelas condições referidas, resta Sérgio Paulinho, Manuel Cardoso e Bruno Pires. Sérgio Paulinho está praticamente fora da equipa, pois já há demasiados gregários e que podem ajudar os líderes na montanha, indo o Sérgio para a Saxo Bank (digam o que disserem, é para lá que vai). A continuação de Manuel Cardoso deverá estar dependente, em primeiro lugar, de quantos sprinters os directores pretenderem ter no plantel, pois Bruyneel nunca gostou de ter muitos (este ano teve mais pelo falhanço da equipa australiana que deixou McEwen e Hunter livres à última hora) e Bennati já está certo. Em segundo lugar dependerá da permanência ou não de Nizzolo na equipa, pois se já é difícil ver uma equipa de Bruyneel com dois sprinters de nível, ainda mais raro é ver três. Quanto a Bruno Pires, tem estado melhor do que eu espectava e terá agora no Canadá duas provas World Tour onde poderá ter a última oportunidade para conseguir um contrato com uma equipa de topo para 2012.

Porém, há um pormenor (ou pormaior) que coloca Machado, Manuel Cardoso, Paulinho e Pires fora da Radioshack-Nissa-Trek. É que somando os corredores vinculados à Radioshack e os corredores vinculados à Leopard para 2012, é ultrapassado o limite de trinta corredores. Isto obriga a que alguns contratos sejam rescindidos e, a menos que alguns corredores aceitem a rescisão amigável ou que a empresa norte-americana que servia de base à equipa Radioshack declare falência, a equipa terá que pagar indemnizações pelos contratos rescindidos. Esta situação incentiva a que a nova equipa fique apenas com corredores que já tinham contrato para 2012, abdicando de renovar aqueles que terminam este ano (situação em que se encontram os quatro portugueses).

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Hoje, na Vuelta, tivemos um dos melhores finais de etapa que alguma vez vi. O Espectáculo protagonizado por Cobo e principalmente por Froome foi impressionante! Para mais tarde recordar!

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O final dos rádios no ciclismo em 2012 não é assim tão certo. Pode ser que continuem a existir rádios nas provas World Tour e .HC e eu ficaria feliz se houvesse também em escalões mais baixos. Afinal de contas, quem é que quer ver um corredor perder uma grande volta por um furo, ou uma Volta a Flandres, ou um Paris-Roubaix, ou uma Taça de Portugal ou o que seja? Se achavam que os rádios tiram espectáculo e fazem com que os ciclistas fiquem presos ao carro de apoio, a Volta a Flandres e as chegadas ao Alpe d’Huez, à Covatilla ou a Peña Cabarga demonstraram que quando os corredores estão para aí virados, o espectáculo que proporcionam é enorme, mesmo com auricular. Vimos ainda que as provas em que não havia rádio continuavam a ser bem controladas pelo pelotão e não foi por isso que vingaram mais fugas.
A maior diferença que vejo entre provas com rádios e provas sem rádios é que nas primeiras é mais rápida a assistência a quedas e problemas mecânicos.

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Não pensem que estou distraído quando à selecção nacional. Mas é que este texto já vai largo e quanto a esse tema há muito por dizer. Prometo pegar nele em breve.

1 comentário:

  1. Excelente texto.

    Já não consigo passar um dia sem passar aqui no teu blog.

    Parabens

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