domingo, 23 de outubro de 2011

O inaceitável fim da Geox?

Depois de vencer a Vuelta através de Juanjo Cobo, depois de anunciar recentemente a renovação de contrato de Cobo e enquanto esperava para saber se em 2012 será World Tour ou continuará no escalão Continental Profissional, o Club Deportivo Bike Live soube na quinta-feira que a Geox deixará de patrocinar a sua equipa, a Geox-TMC, que tem agora a sua continuação em dúvida. Muito dificilmente continuará.

Contrato para 2012 havia, mas parece que os contractos já não valem muito.


Esta equipa (com as suas muitas denominações e patrocinadores) começou a ter sérios problemas em Julho de 2008 e só ainda não desapareceu porque os seus responsáveis têm uma paixão pelo ciclismo igualável por pouca gente. José Antonio Fernández, ou “Joxean Matxin” como é chamado por todos, esteve prestes a tornar-se ciclista profissional em 93, mas com a desaparição da equipa pela qual iria correr viu-se forçado a alterar os seus planos e tornou-se director desportivo de uma modesta equipa amadora espanhola. Tinha 22 anos. Em 98 tornou-se director desportivo da amadora Saunier Duval, em 2001 adjunto da poderosíssima Mapei e em 2003 (quando desapareceu a Mapei) assumiu funções na Vini Caldirola, onde começou a trabalhar com Mauro Gianetti. Gianetti tinha sido ciclista profissional até 2002, venceu uma Liège-Bastongne-Liège e uma Amstel Gold Race e em 96, na sua Lugano natal, foi vice-campeão mundial, batido ao sprint por Johan Museeuw.

A empresa Saunier Duval, patrocinador secundário da Vini Caldirola, em 2004 tornou-se patrocinadora principal da nova equipa de Matxin e Gianetti e foi com o nome de Saunier Duval que a equipa teve os seus momentos de maior estabilidade. O plantel era bom, com Fabian Jeker, Martin Perdiguero, Piepoli, Joaquin Rodríguez e Constantino Zaballa. Cobo foi crescendo, Gómez Marchante também se juntou à equipa e mais tarde Gilberto Simoni, Iban Mayo e aquele que seria um dos carrascos: Riccardo Riccò.

O Giro 2008 tinha sido espectacular, com Riccò a vencer duas etapas e a ser segundo na geral. Na primeira semana do Tour, ganhou duas etapas e Piepoli uma, mas nesse Verão deu-se um passo importante na luta anti-doping, a CERA passou a ser detectada e os dois italianos foram apanhados. A equipa abandonou a prova, a Saunier Duval abandonou o patrocínio e terminou a estabilidade. Terminaram o ano como Scott-American Beef (estiveram na Volta a Portugal e Cobo venceu na Senhora da Graça), em 2009 foram a muito modesta Fuji-Servetto e em 2010 a ainda mais modesta Footon-Servetto, que tinha licença Pro Tour mas que os organizadores não queriam nas suas provas devido à falta de qualidade no plantel. Há cerca de um ano, caiu a bomba (no bom sentido) de que a Geox patrocinaria a equipa de Gianetti e Matxin com um contrato de 50 milhões para cinco anos! Contas simples, 10 milhões para cada ano. Garantiram um Carlos Sastre a baixar de rendimento e um Denis Menchov que tinha sido 3º no Tour anterior. Também um Cobo que procurava voltar ao seu melhor nível, alguns jovens promissores e uns italianos baratos para agradar o patrocinador (que é italiano). Não conseguiram um lugar no Pro Tour e a Geox anunciou que, ou tomava o controlo da equipa, ou abandonava o barco. Mudou de ideias e o barco manteve-se navegável. Agora recusaram-se a dar a garantia bancária para a equipa se inscrever para 2012 e o naufrágio parece iminente.

A temporada foi muito boa para a equipa, com vitória na Vuelta, mas não tão boa para o patrocinador. Tratando-se de uma empresa espalhada por todo o mundo, o objectivo passava por ter uma equipa presente nas maiores montras e ficar de fora de Paris-Nice, Tirreno-Adriático, Volta a Flandres, Paris-Roubaix, Amstel Gold Race, Flèche-Wallone, Liège-Bastogne-Liège, Critérium do Dauphiné e principalmente da Volta a França foi muito mau. Mesmo no Giro, a prestação desportiva foi má e o único destaque foi o oitavo lugar final de Menchov (e as suas prestações na montanha, apesar de sempre longe da vitória) e um segundo lugar de Fabio Duarte. Em termos de destaque para o patrocinador, é muito pouco e só na Vuelta a marca Geox se pode dar por satisfeita.

Entrar no ciclismo seria uma boa aposta para a empresa de calçado, principalmente agora que já há provas importantes até no Canadá ou na China, mas também aí a equipa não esteve presente.

Os responsáveis pela equipa podem dizer que não têm culpa e que até teriam boa equipa para as provas por etapas anteriormente citadas, mas não é bem assim. Por ser uma equipa espanhola, não necessitavam de Sastre para conseguir convites para as provas espanholas, essas estavam asseguradas. Sastre estava a deixar sinais de estar a perder qualidade e o dinheiro despendido com ele poderia ter sido para corredores que abrissem portas em provas italianas e sobretudo francesas. Falta, por exemplo, franceses como Fédrigo, Peraud, Le Mevel, Di Gregorio, Sébastien Chavanel ou Vogondy, apenas para referir alguns que mudaram de equipa em 2011. Se a Geox, a Menchov, juntasse dois ou três destes franceses e mais um ou dois franceses baratos, as suas possibilidades de estar no Tour aumentaria consideravelmente, sem com isso perder a presença em prova alguma. Fica a lição para o futuro, não apenas para esta equipa mas para todas as que ambicionem estar presentes no Tour sem ser World Tour ou francesas.

O Club Deportivo Bike Live deverá apresentar queixa ao Tribunal Arbitral Desportivo (poderá também apresentar num tribunal civil, penso eu), por quebra do contrato, mas a UCI não aceitará a inscrição como World Tour ou Conti Pro sem saber se há ou não dinheiro. Entretanto, os corredores não sabem o que fazer das suas vidas. Matxin e Gianetti estão em contra-relógio para encontrar patrocinador que mantenha a equipa viva. Será muito difícil conseguirem manter uma equipa de alto nível e não acredito que consigam ter uma equipa como a deste ano, mas espero estar enganado e que ninguém saia prejudicado por esta decisão da Geox, para a qual me faltam adjectivos. Que tudo se resolva de boa forma para os corredores e para quem gosta de ciclismo!

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A “nova” Radioshack terá seis directores desportivos: Kim Andersen, Dirk Demol, Alain Gallopin, Luca Guercilena, Lars Michaelsen e o português José Azevedo, com a supervisão de Johan Bruyneel. Kim Anderson, Luca Guercilena e Lars Michaelsen vêm da Leopard-Trek, sendo Andersen o habitual director dos irmãos Schlecks e restantes voltistas da Leopard e Michaelsen o habitual director de Cancellara no pavé desde os tempos da CSC. Demol, Gallopin e Azevedo são bem conhecidos de Bruyneel, que trabalha com Demol desde 2000 (com excepção de 2008), com Gallopin desde 2008 e com Azevedo… todos sabem da ligação entre eles.

De realçar ainda que o português Ricardo Scheidecker continuará a exercer as funções de director técnico que já exercia na Leopard, faltando saber se Francisco Carvalho (da parte da Radioshack) e José Eduardo (da parte da Leopard) continuam como mecânicos. Os corredores serão os que já toda a gente sabe: Tiago Machado e Nelson Oliveira.

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Os leitores lembram-se da Saxo Bank estar prestes a abandonar o patrocínio à equipa em 2010 e depois ter mudado de ideias com a contratação de Contador? Parece que continuaram mas o investimento é cada vez menor, pois este ano viu-se que pouco poderiam fazer onde Contador não estava presente e para o próximo ano não há grandes melhorias. Continuará a ser uma equipa centrada em Contado, com Chris Sorensen para outras provas com montanha, Juan José Haedo para as chegadas ao sprint e Nick Nuyens para as clássicas de pavé. Sérgio Paulinho e Bruno Pires deverão ser dois dos principais gregários de Contador se o TAS confirmar não-suspensão da RFEC (tantos meses depois…).
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Com a ausência de provas, há menos temas para comentar ou, pelo menos, menos temas interessantes. Tentarei mesmo assim ir colocando novos artigos no blog.

6 comentários:

  1. Realmente tenho pena que a Geox caia por terra. Parece que o fim é inevitável e agora Cobo eatrá a ser disputado no mercado. Eu pessoal mente acho que a equipa que o deveria contratar e ganharia mais com isso seria sem dúvida a Saxo Bank.Isto,porque vive apenas em volta de Contador, com Cobo e se De La Fuente e Fabio Duarte também viessem no pacote a equipa teria um novo fulgor. quanto ao nosso David Blanco penso que virá para Portugal (Tavira parece-me óbvio), para tentar bater o recorde vitórias na Volta, ou para uma equipa espanhola de segunda como Andalucia ou Caja Rural, mas Caja Rural está a reforçar-se bem.

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  2. Bem-vindo Davide (penso que é a primeira vez que aqui escreves) :)

    Tal como digo no artigo, a Saxo Bank está com o orçamento apertado e talvez o Cobo arranje melhor, apesar de por esta altura não ser fácil. Se a Saxo Bank tiver condições para isso, seria um bom reforço, pois realmente a equipa está muito limitada ao Contador (e ao Chris Sorensen) para provas por etapas. O "problema" é que o Cobo ganhou a Vuelta, certamente quererá ser chefe-de-fila no próximo Tour ou Vuelta e com o Contador na equipa isso será impossível. O ideal era a equipa continuar, independentemente do patrocinador, e ficaram todos empregados.

    Quanto ao David Blanco, não sei. A época correu-lhe mal e duvido que consiga um contrato como o que tinha este ano. Apesar disso, se não conseguir nada no estrangeiro, acredito que queira tentar bater o recorde de Voltas a Portugal.

    Cumprimentos ;)

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  3. Curioso. Quando a Cantanhede/Marialva terminou com o patrocínio (2002? 03?), depois de ter contratos firmados e equipa contratada, pensei que coisas dessas só aconteciam em Portugal. Pelos vistos, mesmo a níveis mais elevados, a falta de respeito pelos contratos no ciclismo (se calhar não só no ciclismo...) também acontece lá por fora. Se é assim lá fora, prevejo um futuro muito negro para o nosso ciclismo. Se tiver futuro...
    Abraço.

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  4. E por falar em David Blanco e no voltar a Portugal...não têm surgido notícias algumas sobre transferências nas equipas portuguesas para a próxima época nem tão pouco se irá surgir alguma equipa nova ou por outro lado acabar alguma das que estão no activo..Rui sabe alguma coisa relativamente à próxima época no que às equipas portuguesas diz respeito?

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  5. Obrigado pelos comentários ;)

    Parece que o Boavista está tremido, Tavira tremido continua por não ter patrocinador, Barbot passa a ser Efapel mas baixa orçamento e Paredes também deve baixar. Não sei se em 2012 haverá algum corredor em Portugal que possa dizer que é profissional.

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  6. Obrigado Rui é que já começava a ser desesperante nesta altura do ano não ter qualquer notícia em relação à próxima temporada..avizinham-se então tempos difíceis para os ciclistas portuguesas, algo que já não vem de agora.

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