domingo, 11 de setembro de 2011

Como é que o Sérgio Ribeiro não tem lugar nesta selecção?

Já saiu a lista de pré-seleccionados para os próximos Campeonatos do Mundo e, tal como esperado, regista-se a ausência do Sérgio Ribeiro. O corredor com mais sucesso nos dois últimos anos em território português, este ano obteve 12 vitórias, incluindo a Taça de Portugal e duas etapas na Volta a Portugal (onde foi sexto no final), é virtual vencedor do ranking da APCP mas não foi pré-seleccionado para os Mundiais. Por falta de qualidade, não é. Por haver 9 corredores portugueses mais capacitados que ele para uma prova como esta, também não será. Só mesmo os responsáveis da Federação poderão dizer o motivo que tantos adeptos portugueses querem saber. Não podemos ignorar que, pela terceira vez, é cometida esta injustiça com o Sérgio Ribeiro.


Surpresa? Nenhuma!

Em primeiro lugar, recomendo a leitura deste texto do próprio Sérgio. Como ele diz, já esperava esta não-convocação. E, como também eu já tinha dito, era de esperar que mais uma vez deixassem o Sérgio de fora. Sim, “deixassem”, no plural, porque não acredito que seja uma decisão única e exclusivamente do seleccionador José Poeira.

Desde que foi anunciada a lista de nove pré-inscritos, tenho lido opiniões de muitos adeptos e todos eles criticam a ausência do Sérgio Ribeiro na lista. Não se trata de algo que gere discórdia. Toda a gente concorda que o Sérgio, pelo que fez nos dois últimos anos, merecia ser convocado e acredito que tanto o seleccionador como quem está acima dele concorda com isso. Pura e simplesmente, alguém não quer o Sérgio Ribeiro na selecção. Quem? Não sei. Porquê? Também não sei e talvez nem o próprio corredor saiba.

A primeira situação semelhante a esta aconteceu em 2006, para os Campeonatos Mundiais de Salzburgo. Nessa ocasião o Sérgio constava na lista de pré-seleccionados comunicada pela Federação, mas afirmava que ninguém tinha falado consigo e que não tinha recebido qualquer carta. Pouco tempo depois, saiu a convocatória final e o Sérgio Ribeiro não estava convocado, apesar de ter sido o vencedor do Ranking da Associação Portuguesa de Ciclistas Profissionais, de ter sido um dos mais vitoriosos da temporada (incluindo na Volta ao Alentejo, que na altura tinha mais qualidade do que actualmente) e de se adaptar na perfeição ao circuito onde Paolo Bettini se sagraria campeão mundial pela primeira vez. Foi estranho, mas como era a primeira vez, ainda se aceitou que a decisão se devia exclusivamente a uma opção de José Poeira.

No ano passado voltou a haver alguma surpresa quando saiu a convocatória e o Sérgio Ribeiro não constava, apesar da grande época que tinha feito, mas este ano já era dado quase adquirido que não faria parte dos planos. O motivo é que continua a ser segredo. Como diz o próprio no texto que anteriormente indiquei, ainda pensou que fosse por erros do passado e também eu o pensei. Poderia ser pelo controlo anti-doping positivo que teve em 2007 (e o deixou de fora da competição até meados de 2009), mas já este ano, para o GP da Toscana (da Taça das Nações sub-23) a selecção nacional contou com Daniel Freitas. E para quem não sabe ou não se lembra, recordo que o Daniel Freitas também acusou doping há 2 anos, ainda em júnior, num dos maiores escândalos que se viram no ciclismo português e resolvido com uma hipocrisia que enoja qualquer um. Tão absurdo e hipócrita que ainda ninguém tinha ido a julgamento e já os directores da ADRAP (onde corria Daniel Freitas e o então cadete João Pinto, também ele positivo pela mesma substância) diziam que nada aconteceria porque tinham muito peso dentro da Federação e não podiam ser castigados.

Mas voltemos ao Sérgio Ribeiro. Excluída a hipótese de o controlo anti-doping de 2007 ser o motivo deste afastamento, desconfio que o motivo seja excesso de personalidade. É que no ciclismo português há quem controle tudo e quem quiser dar-se bem neste meio tem que saber quando é para calar, quanto é para se curvar em vénia e quando é para dizer “sim, senhor”. Há quem o faça e por isso se dê bem, mas também há quem não esteja disposto a curvar-se. Pelo que conheço do Sérgio, não é antipático nem arrogante (tenho muito boa impressão de si) mas talvez um dia não tenha feito a vénia que alguém esperava. Em 2012 há eleições e o actual presidente da FPC não pode continuar no cargo (qualquer dia, até o Alberto João Jardim tem que sair do poleiro), pelo que é possível que haja alterações significativas na direcção da Federação… ou não. Se houver, talvez o Sérgio seja opção para os Mundiais de 2012. Talvez.

Quanto à pré-selecção em si, é composta por Manuel Cardoso, Sérgio Paulinho, Tiago Machado e Nelson Oliveira (Radioshack), André Cardoso e Ricardo Mestre (Tavira-Prio), Rui Costa (Movistar), Filipe Cardoso (Barbot) e Hernâni Brôco (LA/Antarte), sendo os dois homens para o contra-relógio escolhidos entre Machado, Rui Costa e Nelson Oliveira. Rui Costa já anunciou que estaria presente nas duas provas e Tiago Machado tinha dito no primeiro dia de descanso da Vuelta que já era tarde para o comunicarem de algo. Hernâni Brôco não tem competição “a sério” desde a Volta a Portugal e por isso não deverá estar em forma para ir a Copenhaga. E aqui surge mais uma crítica.

Então a Federação tem a oportunidade de levar uma selecção à Volta a Tenerife, onde supostamente poderia aproveitar para rodar corredores com vista ao Mundial, leva quatro homens que depois deixa fora da pré-convocatória para Copenhaga, metendo na lista alguém que entre a Volta a Portugal e os Mundiais apenas teve alguns circuitos de poucos quilómetros? A Volta a Tenerife serviu para quê? Que o Hernâni Brôco é um dos melhores corredores portugueses e que poderia representar Portugal com dignidade, ninguém dúvida, e sendo eu amigo dele, gostaria de o ver mais uma vez com as cores nacionais. Mas esta política deixa muito a desejar. Há duas hipóteses: a) se a Federação contava realmente com o Hernâni, deveria selecciona-lo para Tenerife para que ele pudesse chegar a Copenhaga num estado de forma aceitável; b) se o Hernâni está sem competir e houve gente que foi a Tenerife para manter um nível de forma dentro do aceitável, tem que ser um deles a ficar com o lugar na pré-selecção.

Se alguns dos escolhidos para Tenerife não eram, de antemão, opção para Copenhaga, então em vez deles que fossem outros a Tenerife. Hugo Sabido e Sérgio Sousa são dois exemplos de bons corredores que ficaram de fora e poderiam representar a selecção dignamente num percurso como este (tal como alguns dos que foram a Tenerife). Afinal de contas, para que serviu a Volta a Tenerife? Para que servirá em Outubro a Volta a Guatemala?

Não, não acho que se trabalhe convenientemente a selecção nacional. Os bons resultados de Sérgio Paulinho, Rui Costa e mais recentemente Nelson Oliveira com as cores portuguesas foram fruto do trabalho que realizaram diariamente por sua conta e com as condições que as suas equipas lhes proporcionaram. Uma das tarefas do seleccionar (e da sua equipa, se é que a tem) é escolher os melhores corredores há sua disposição e muitas vezes não tem acontecido isso, tanto em elites, como em sub-23, como em juniores. Outra tarefa passa por montar as estratégias para as provas e o que temos visto nos últimos anos são selecções em que um ou dois corredores terminam (às vezes em bons lugares, outras vezes não) e os restantes desistem sem alguma vez se terem mostrado. A nossa selecção não é como a espanhola, a italiana, a holandesa, a belga, a australiana, a norte-americana ou outra de topo. Nunca tivemos um super-candidato às medalhas nas provas em linhas e temos que encarar as provas com humildade. Se não temos um Freire, um Gilbert, um Hushovd, um Farrar, um Bennati, um Greipel ou um Allan Davis, não precisamos de ir a Copenhaga com seis corredores a pouparem-se para nas duas últimas voltas atacarem, perseguirem ou prepararem uma chegada ao sprint. Também não tínhamos super-candidatos nas edições anteriores e a equipa lusa protegeu-se no meio do pelotão como se todos fossem candidatos às medalhas. É preciso mostrar atitude! Se é para desistir, que desistam, mas enquanto lá estiverem, que se mostrem. Dos últimos anos, recordam-se boas classificações do André Cardoso em elites e do Rui Costa em sub-23. Porque motivos nunca vimos um dos outros corredores numa fuga inicial? Não se trata de algo que se passou no último ano ou no anterior mas sim nos últimos cinco, seis ou sete anos. Na Volta a França do Futuro de 2007, no ano antes ao 2º lugar do Rui Costa, chegou-se a dar o caso de se formar uma fuga de mais de vinte corredores e Portugal não tem nem um representante nela. Logo ao terceiro dia ficamos fora da luta por um lugar no top-10. Será só culpa dos corredores? Não me parece.

*****
Sobre a Vuelta que está prestes a terminar, não me vou alongar muito, mas nota positiva para a prestação do Sérgio Paulinho, que esteve quase a vencer uma etapa. Este é o Sérgio que todos gostamos de ver, combativo e empenhado em algo mais do que levar bidões aos seus chefes-de-fila. Em 2010, Armstrong e Bruyneel fizeram-lhe uma grande proposta, tal como a grande parte dos corredores da Astana, com o objectivo de deixar Contador o mais desfalcado possível. Como o Contador estava a meio duma novela e queria sair da Astana (apesar de ter contrato), não podia garantir a ninguém onde iria correr e o Sérgio aceitou a proposta da Shack, muito boa financeiramente. Dois anos depois, a proposta de renovação que a equipa lhe apresentou não o satisfez e talvez tenha percebido que levar água fresquinha pode ser elogiada por alguns amigos e convencer alguns adeptos de que é um trabalho sensacional, mas as grandes equipas não estão dispostas a pagar assim tanto por um aguadeiro. Por isso se tem feito à vida (e ao contrato) nesta Vuelta.

O Sérgio não tem a capacidade que tinha o José Azevedo para destruir adversários na montanha ou a capacidade que tem Cancellara para quase sozinho diminuir drasticamente a vantagem de quatro ou cinco fugitivos. Mas o Sérgio é um corredor muito completo, que passa bem a média montanha, tem alguma velocidade e endurance para aguentar uma larga distância em fuga. Ainda não tem contrato assinado para 2012 (pelo menos, que se saiba publicamente) e apesar de ser quase certo que vá para a Saxo Bank carregar bidões, eu preferia vê-lo noutro tipo de equipa. Poderia não ter um colega a lutar por grandes voltas, mas eu gostava de o ver com liberdade para tentar a sua sorte em fugas, não só no final da temporada quando tudo está perdido, mas durante todo o ano. Para isso, é preciso alguém que lhe dê motivação, que o espicace, em vez de dizer para ter calma porque é o melhor aguadeiro do mundo. Já não é um jovem, mas ainda pode ser mais do que isso.

1 comentário:

  1. Acho que é uma grande injustiça eu já no ano passado me tinha questionado sobre isso e este ano ainda mais me questiono...e sempre pensei que foi por episódios antecipados, mas como tu referiste houve episódios semelhantes o do Daniel Freitas.
    Parece que o Sérgio não é um ciclista nada acarinhado pela Federação,porque depois da sua enorme carreira, não ser convocado para os mundiais é frustrante.
    Quanto aos nossos outros tugas o Sérgio Paulinho fez uma bela Volta a Espanha,pena não ter ganho nenhuma etapa, o Nélson Oliveira fez a sua primeira competição de 3 semanas e faço um balanço positivo(mas esperava contra-relógio um pouco melhor) e o Tiago ficou mal na geral devido aquele furo do Zubeldia senão penso que faria facilmente um top 20(e fez um grande contra-relógio).
    Quanto ao seu futuro o Nélson irá continuar o Tiago Machado também acredito que sim, já o Sérgio é certo que irá mudar em principio para a Saxo-Bank e os outros dois o Manuel Cardoso ainda poderá ter algumas hipóteses de ficar já o Bruno Pires também deve de ir embora.

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