terça-feira, 18 de setembro de 2012

Mundiais 2012: corrida sem dono

Estamos a menos de uma semana de se disputar o Campeonato do Mundo de fundo, um Campeonato em que não há claros favoritos e nenhuma das selecções mais poderosas se concentrará em torno de um só homem. Umas porque não têm nenhum grande favorito, outras porque têm vários, mas Espanha, Itália, Bélgica, Austrália e Holanda não deverão ter estratégias muito rígidas, dando liberdade aos seus ciclistas para actuarem em conformidade com a situação de corrida.


O Mundial de 2011 é um excelente exemplo... do que não será este. No ano passado, a Grã-Bretanha controlou a corrida para Mark Cavendish, aproveitando que não havia qualquer dificuldade no percurso, e Cavendish respondeu com a vitória. Nos Jogos Olímpicos tentaram fazer o mesmo mas aí foi impossível por apenas terem cinco ciclistas: Cav, um lançador que tinha que ser poupado para a parte final (Ian Stannard), outro ciclista que também tinha responsabilidade no lançamento do sprint (David Millar) e dois para controlarem o pelotão (Wiggins e Froome). Sem a ajuda de outras selecções, foi impossível controlarem a corrida, mesmo com o apoio de Bernhard Eisel na parte final (sim, austríaco mas braço-direito e colega de quarto de Cav na HTC e agora na Sky).

A análise aos favoritos fica para outro dia, mas olhemos agora à composição das selecções mais poderosas e ao que poderá ser a sua corrida. A vitória pode escapar-lhes e o caso do letão Romans Vainsteins está aí para relembrar isso mesmo, ele que se sagrou campeão mundial em 2000 com apenas dois colegas à partida (ambos desistiram). O próprio Hushovd, apesar de ser um dos melhores ciclistas da sua geração a nível mundial, só tinha dois colegas em 2010, quando conquistou a camisola arco-íris. E Oscar Freire, quando em 1999 venceu o seu primeiro Mundial, só tinha 23 anos, corria na Vitalicio Seguros e estava muito longe de ser um favorito ao ouro (apesar da prata conquista no escalão sub-23 dois anos antes). Como se pode constatar, nem sempre a vitória vai para os favoritos e tão-pouco é um garantia que vá para uma das principais nações, mas estas são fundamentais para o desenrolar da corrida e a sua postura condiciona o desfecho final. Elas fazem a diferença entre uma corrida controlada por um grande grupo até à última volta ou uma corrida com espaço para ataques de longe serem bem-sucedidos.

Austrália

(Simon Clarke, Allan Davis, Simon Gerrans, Adam Hansen, Heinrich Haussler, Michael Matthews, Richie Porte, Wesley Sulzberger e David Tanner)

Van Avermaet, Gerrans e Rui Costa,
três homens a ter em conta nestes Mundiais
Não tem o ex-campeão Cadel Evans mas têm um dos melhores ciclistas da temporada, Simon Gerrans, vencedor do Tour Down Under, Milano-Sanremo e GP de Québec, e que para mim é um dos 5 principais candidatos à vitória. Allan Davis e Heinrich Haussler terão que sofrer mais para aguentar o Cauberg, mas também são dois dos sprinters que melhor passam estas curtas subidas. Richie Porte é a opção para um outro cenário: uma corrida mais dura e com diferenças feitas no Cauberg. Se assim for, ele é a melhor alternativa a Simon Gerrans.

Algo que os australianos têm e outras selecções de referência não é gente para trabalhar. O recente vencedor da classificação da montanha da Vuelta, Simon Clarke, Adam Hansen, Wesley Sulzberger e David Tanner deverão assumir o controlo da corrida para Gerrans. Até mesmo o ex-campeão mundial sub-23 Michael Matthews e Davis poderão fazê-lo.
No que depender da Austrália, teremos uma corrida controlada para que Simon Gerrans apenas se tenha que preocupar em responder a ataques na fase final.

Bélgica

(Tom Boonen, Kevin De Weert, Dries Devenyns, Philippe Gilbert, Björn Leukemans, Gianni Meersman, Jurgen Roelandts, Greg Van Avermaet e Johan Van Summeren)

Se Philippe Gilbert tivesse feito uma temporada semelhante à de 2011 (nem precisava de ser do mesmo nível, bastava estar perto) acredito que a Bélgica estaria quase a 100% empenhada em leva-lo à vitória. Gilbert fez uma grande Vuelta, levou duas etapas para casa e é um dos grandes candidatos ao título mundial, mas Tom Boonen, Greg Van Avermaet e Björn Leukemans não deverão sacrificar-se por ele. Leukemans adapta-se bem a este tipo de percursos, este ano viu-se afastado das Clássicas das Ardenas por problemas num joelho mas recentemente tem dado muito boas indicações e é um ciclista que corre por si mesmo. Van Avermaet saiu da Lotto (de Gilbert) para a BMC no final de 2010 para poder ser líder nas clássicas acidentadas, fez uma boa temporada mas este ano voltou a ter a companhia de Gilbert. Não andou bem nas Clássicas das Ardenas mas ultimamente tem estado em grande forma e poderá lutar pelas medalhas. Estará disposto a sacrificar-se por Gilbert? Veremos.

Tom Boonen é o melhor ciclista da história do pavé, um dos melhores corredores de sempre em provas de um dia e tem a ambição de lutar por este título mundial (seria o segundo, depois de 2005). Eu não o acho capaz de ultrapassar o Cauberg, mas ele acha-se e vai fazer por isso. Gianni Meersman foi uma das revelações do começo da temporada (venceu uma etapa no Algarve e outro na Paris-Nice, entre outros bons resultados), teve que abandonar o Giro por problemas físicos mas na Vuelta voltou a estar bem e é um corredor que se pode adaptar a este percurso.

A Bélgica tem mais homens capazes de lutar pela vitória do que a Austrália, mas tem igualmente muita gente para trabalhar. Kevin De Weert, Dries Devenyns, Jurgen Roelandts e Johan Van Summeren devem fazê-lo sem problemas, ou pelo menos isso esperam os belgas.


Espanha

(Jonathan Castroviejo, Alberto Contador, Juan Antonio Flecha, Oscar Freire, Pablo Lastras, Daniel Moreno, Joaquim Rodríguez, Samuel Sánchez e Alejandro Valverde)

Valverde, Contador e Rodríguez,
colegas ou cada um por si?
Equipa de egos, com Joaquim Rodríguez e Alejandro Valverde como principais armas, Alberto Contador para tentar rebentar a corrida na última subida ao Cauberg para assim poder lutar pela vitória, Oscar Freire que ambiciona o seu quarto título mundial (o último foi há 8 anos) e estará especialmente motivado pelo 4º lugar na Amstel Gold Race deste ano, e Samuel Sánchez que também não vejo a trabalhar para ninguém, principalmente por ter um título olímpico e 34 anos, começando a ficar tarde para chegar a um título mundial (ou uma medalha, porque tem dois quartos lugares mas zero medalhas). Como se não bastasse, ainda têm Daniel Moreno, que depois de duas vitórias no Paris-Nice, duas em Burgos (+ geral) e o 5º lugar na Vuelta deverá estar mais confiante do que nunca.

Pablo Lastras e Castroviejo serão os homens de trabalho e esperam que pelo menos Flecha também o faça. De resto, são muitos galos para um poleiro. Quando ciclistas importantes começarem a atacar, deverá ser cada um por si.


Holanda

(Lars Boom, Koen De Kort, Robert Gesink, Karsten Kroon, Bert-jan Lindeman, Bauke Mollema, Tom Jelte Slagter, Laurens Ten Dam e Niki Terpstra)

A Holanda não tem nenhuma super vedeta mas corre em casa e quase todos estes homens devem ter marcado esta data no seu calendário com muito tempo de antecedência. De Kort e Lindeman não deverão ter qualquer problema em tentar manter a corrida controlada, Niki Terpstra também tem poucas hipóteses de lutar por medalhas neste percurso e acredito que trabalhará, tal como Karsten Kroon (36 anos e duas últimas épocas apagadas) e até os homens da Rabobank.

Gesink vem de um 6º lugar na Vuelta, Ten Dam foi 8º e Bauke Mollema terminou as três principais Clássicas das Ardenas deste ano nos dez primeiros, podendo todos eles, se estiverem na melhor forma, ser homens a ter em conta. Mas se não estiverem nas melhores condições, acredito que trabalharão para os seus colegas (de selecção, equipa e formação, nalguns casos). O mesmo é válido para Lars Boom e o jovem Tom Jelte Slagter.

Existirão muitos ataques e cabe à selecção holandesa ter um dos seus principais homens em cada mexida importante.

Itália

(Eros Capecchi, Dario Cataldo, Oscar Gatto, Marco Marcato, Moreno Moser, Vicenzo Nibali, Giacomo Nizzolo, Rinaldo Nocentini, Luca Paolini, Matteo Trentin, Diego Ulissi - 2 ficarão de fora da lista definitiva, a anunciar no dia 20)

E temos a Itália, historicamente a selecção em que é cada um por si, com excepção de um pequeno período em que se uniram em torno de Paolo Bettini (agora seleccionador). Ainda não anunciaram o seu 9 definitivo mas entre os 11 que ainda estão na luta não se vê ninguém com perfil de gregário. Muitos tubarões e aspirantes.

Vicenzo Nibali é o mais conceituado, Moreno Moser tem feito uma grande temporada e tem legítimas aspirações às medalhas e Luca Paolini vem coleccionando lugares de destaque nas últimas duas semanas. São os três candidatos mais fortes entre os italianos, mas também Dario Cataldo, Oscar Gatto, Marco Marcato e Rinaldo Nocentini se adaptam ao perfil destes Mundiais. Os mais fáceis de convencer a assumir o papel de equipiers ainda poderão ser os jovens Capacchi, Nizzolo, Matteo Trentin e o bicampeão mundial junior (2006 e 07) Diego Ulissi, se Bettini decidir pela sua integração na selecção final. Um dia poderão ser eles a liderar a selecção italiana.


Estas são as que considero as cinco "grandes". Brevemente falarei de quem considero serem os favoritos às medalhas, mas são estas que têm o poder para tomar as rédeas do pelotão com mais firmeza. No caso dos australianos, belgas e holandeses farão por isso. No caso dos espanhóis e italianos... veremos.

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