Um fantástico Paris-Roubaix, o segundo mais rápido de
sempre, que termina com um apertadíssimo sprint entre Fabian Cancellara e Sep
Vanmarcke, o grande candidato e uma das maiores promessas do ciclismo belga. A
imagem de Cancellara exausto na relva do velódromo ficará como uma das mais marcantes desta
temporada.
Foi necessário esperar mais de 120 quilómetros para que um
grupo se conseguisse estabilizar na frente de corrida, depois de muitos
ataques, contra-ataques e perseguições que levaram a que 94 quilómetros fossem
percorridos nas duas primeiras horas, uma média de 47 km/h.
Mathew Hayman (Sky), Gert Steegmans (Omega Pharma), Stuart O’Grady
(Orica) e Clement Koretzky (Bretagne) lideraram a corrida na passagem por
Arenberg, que serviu para colocar o pelotão em fila indiana mas continuando muito numeroso.
Quedas e furos começaram a marcar alguns homens
importantes. Hushovd, Geraint Thomas, Pozzato, Degenkolb, Borut Bozic, Offredo,
Ladagnous, Turgot, Roelandts e Van Summeren foram alguns dos azarados do dia,
enquanto muitos ciclistas animavam a corrida com constantes ataques. O principal
deles foi Damien Gaudin (Europcar), vencedor da versão sub-23 em 2007, que
atacou, atacou e atacou enquanto pôde, deixando tudo o que tinha na estrada.
Fabian Cancellara ficou muito cedo sem equipa, mas hoje não
tivemos uma marcação tão apertada ao suíço como em 2011. Havia muitos ciclistas
que sabiam que tinham legítimas aspirações ao pódio e que, sem Cancellara, até
poderiam discutir a vitória, ciclistas esses que não se inibiram de atacar e de
se perseguir uns aos outros, numa corrida muito movimentada em que ninguém se
conseguia distanciar seriamente dos adversários.
Se na Volta a Flandres vimos uma Omega Pharma-Quick Step
muito desorientada pela desistência do líder Tom Boonen, hoje tivemos uma OPQS completamente
diferente e taticamente próxima da excelência. Stijn Vandenbergh e Niki
Terpstra aceleraram no grupo de favoritos e iniciaram uma série de mexidas que
restringiria ainda mais o grupo e deixaria na cabeça-de-corrida apenas
Vandenbergh e Sep Vanmarcke (Blanco).
Quando Fabian Cancellara arrancou em perseguição do duo da
frente, levou na sua roda Zdenek Stybar. Stybar foi campeão mundial de
ciclocrosse em 2010 e 2011, ano em que o milionário checo Zdenek Bakala se
tornou coproprietário da equipa Quick Step e pagou a clausula de
rescisão para que o seu compatriota Stybar pudesse deixar a Telenet (equipa
focada no ciclocrosse) e iniciar uma carreira virada para o ciclismo de
estrada.
Com um colega na frente, Stybar não deu um único relevo até
Cancellara fechar o espaço, deixando a OPQS com dois ciclistas entre os quatro
que deveriam disputar os lugares de pódio. Deveriam se o Paris-Roubaix não
tivesse uma componente tão forte de sorte ou azar.
Vandenbergh, Stybar, Cancellara e Vanmarcke entraram juntos
no Carrefour de l’Arbre (a 18 km da meta), o último setor de pavé de grande
dureza e muito provavelmente a última oportunidade para Cancellara se isolar. Vandenbergh
começou a acusar o desgaste e a ceder, ficando irremediavelmente fora da
discussão depois de chocar com um adepto e protagonizar uma queda aparatosa. A
discussão continuou entre os três sobreviventes, com Cancellara a atacar e
Vanmarcke e Stybar a responderem muito bem, especialmente o checo, que seria uma grande ameaça a Cancellara em caso de sprint.
Sprintar depois de 250 km é muito diferente de sprintar numa etapa plana de 180
quilómetros, ainda mais quando os 250 km têm a dureza de um Paris-Roubaix. A resistência torna-se um fator muito importante e é um dos
ingredientes que fazem de Fabian Cancellara um dos maiores especialistas em
clássicas da última década, capaz de estar muito perto dos melhores sprinters
do mundo. Isso mesmo demonstrou nos Mundiais de 2011, apenas batido por Cavendish,
Greipel e Goss.
Porém, Stybar também ficou fora da discussão da corrida
depois de um incidente com um adepto que quase provocou a queda, fez com quer
perdesse o ritmo e nunca mais conseguisse recuperar, sendo alcançado pelo grupo
perseguidor. A discussão estava entregue a Fabian Cancellara e Sep Vanmarcke,
um jovem de 24 anos de idade que nunca temeu o seu oponente.
Tom Boonen foi o grande dominador destas clássicas em 2012 e
apenas perdeu uma, a Omloop Het Nieuwsblad, onde foi batido ao sprint por
Vanmarcke. O jovem belga foi um dos mais ativos nas clássicas belgas seguintes mas ficou doente antes do Paris-Roubaix e não pôde mostrar-se na sua melhor
forma. Este ano os azares voltaram a bater-lhe à porta e a obrigar a uma
desistência no Tirreno-Adriático. Decidiu que a partir daí só interessava recuperar e preparar-se para a Volta a Flandres e o Paris-Roubaix. Todas
as outras corridas entre o T-A e a Ronde seriam apenas preparação, tudo para
que pudesse estar a 100% nos dois grandes objetivos da temporada.
Confiante no que tinha feito, Vanmarcke não temeu Cancellara
e colaborou com o suíço para que não fossem alcançados. Mesmo quando ficou
claro que os dois primeiros lugares do pódio estavam entregues, o belga não
desarmou. Cancellara ainda tentou surpreender já nos quilómetros finais mas sem
sucesso. Entraram no Vélodrome de Roubaix juntos, num jogo do gato e do rato
como se estivessem numa prova de sprint de pista. A frieza de Cancellara fez-se
notar, tal como a inexperiência de Vanmarcke, que se colocou diante do seu
adversário. Arrancaram para um sprint aperdadíssimo, lado a lado, e Cancellara
de braços no ar. Um levantar de braços exausto, muito diferente da semana
passada ou das suas anteriores vitórias na Volta a Flandres ou em Roubaix,
todas elas isolado. Desde 2008 que não havia sprint no velódromo para a
discussão da vitória e então foi Boonen a superiorizar-se a Cancellara e Ballan.
Sep Vanmarcke desolado no final |
A Vanmarcke talvez apenas tenha faltado frieza, mas esteve a
um nível irrepreensível e que deixa grandes expectativas sobre o futuro da sua
carreira. Muito emocionado e sobretudo desiludido pela oportunidade perdida, foi a chorar que respondeu às perguntas dos jornalistas.
O terceiro lugar foi para Niki Terpstra, que bateu ao sprint
Greg Van Avermaet e Damien Gaudin. Um lugar no pódio que fica a saber a pouco
depois da excelente prestação da Omega Pharma, um prémio de consolação depois
da ausência de Boonen, os problemas mecânicos de Sylvain Chavanel, a queda de
Vandenbergh e o incidente que retirou Stybar da luta pela vitória.
Podem os adeptos ser culpados pelas quedas de Vandenbergh ou
Stybar? Parece-me difícil, quando são os ciclistas que escolhem ir na berma da
estrada. Podem os ciclistas ser culpados? Também não me parece, sendo tão duro
ir pelo meio e legítimo que tentam diminuir o sofrimento.
Stybar ainda foi sexto neste seu primeiro Paris-Roubaix, e entre os dez primeiros seis são estreias no top-10: Vanmarcke (2º), Van
Avermaet (4º), Gaudin (5º), Stybar (6º), Langeveld (7º) e Kristoff (8º).
Esta foi a segunda edição mais rápida da história do Paris-Roubaix, com uma média de 44,19 km/h, apenas batida pela edição de 1964 onde Peter Poos venceu com 45,13 km/h.
Pódio do Paris-Roubaix 2013 Sep Vanmarcke, Fabian Cancellara e Niki Terpstra |
*****
Tivemos hoje duas vitórias portuguesas além-fronteiras. Rui Costa venceu
a Klasika Primavera e Fábio Silvestre venceu a última etapa no Circuito das
Ardenas. Também Leonel Coutinho venceu ontem a Clássica da Páscoa em Espanha. Por outro lado, a estreia da seleção junior não correu da melhor
maneira, apenas com um português a concluir a prova e no 62º lugar. São
assuntos para a Revista da Semana de amanhã, bem como a Volta ao País Basco
vencida por Nairo Quintana e onde Alberto Contador voltou a estar longe do
melhor nível da sua carreira.
Rui Costa venceu a Klasika Primavera |
não cabia um feijão no c% do cancellara, cagadinho de medo do vanmarke...
ResponderEliminarparece-me que o peter sagan devia trazer a publico aquela conversa do cancellara sobre ir na roda, porque hoje foi isso que ele fez...
Rui tal como tinha dito na antevisão a capacidade da Shack ia ser medida pelos ataques que a corrida tivesse e assim foi. Desiludi-me com a Lotto que desde que comecei a ver (eram 13h15m) não lhes vi 1 assomo qualquer que fosse.
ResponderEliminarBem esteve a BMC acabam por falhar os seus lideres (Thor ficou completamente a pé no ataque do Cancellara), sobrou o suspeito do costume Greg Van Avermaet que fez 4º...
A Omega devia ganhar o prémio de azarada da semana, perde Bonnen na Ronde, perde chavanel por avaria, perde Vandenbergh por queda e Stybar numa altura que apenas a frieza de Cancellara poderia bater e isto se ele e o Vanmarcke o atacassem, senão ia bate-los aos dois.
Cancellara esteve ao seu nível, muito frio e em grande forma...
Muito bem esteve a Sky a animar a corrida, sempre que pode lançou alguém...falhou no resultado final, penso que o melhor tenha sido o Eisel (vim trabalhar e não pude ver a geral final).
Uma palavra para a Blanco que não fugiu nada a cara a luta, Boom é um poderio de força, mas na minha opinião é outro Gesink, têm mais potencial que resultados. Já Vanmarcke mostrou que ia muito forte, se tivesse mais experiência poderia ter vencido, a partir do momento que cancellara o tentou deixar para trás deveria ter-se limitado a ir na roda, a vantagem permitia isso.
Agora viram as classicas das Ardenas e com 1 senhor que mostrou hoje que apesar de estar 1 mês sem competir uma semana bastou para estar em grande, Rui Costa é um nome a ter muito em conta, principalmente com 1 Movistar que parece estar em muito boa forma para o ajudar, penso que irá melhorar a prestação da época passada.
Luís concordo plenamente contigo, só que o Rui tem à sua frente o Valverde. Quanto ao Gesink, ele tem muitos azares e se calhar por isso não consegue mostrar resultados, porque ele cai quando está em forma. Vamos ver como ele vai para o Tour este ano, gostava de o ver no top-5. É um ciclista não muito explosivo mas muito físico e consegue aguentar altos ritmos em muitos km. Quanto ao Boom, esperava mais mas o Vanmarcke para mim é melhor que ele e com este Paris-Roubaix ele consegue ganahr experiência para o próximo ano, onde poderá tentar vitória.
ResponderEliminarO Valverde caiu na Catalunha pelo que não estará em bom momento já agora... Além de que nas classicas das Ardenas a equipa é importante, mas o Rui tem sempre luz verde...
ResponderEliminarNão faço futurologia mas acredito plenamente que não fosse o azar de Stybar e o checo venceria esta corrida..enfim..os azares fazem parte das corridas.
ResponderEliminarGostei do Paris-Roubaix, só tive pena de não termos o prazer de ver Boonen e Ballan, pois acredito que com estes dois, seria uma das melhores provas dos últimos anos, gostei do facto da Omega não se ter "escondido", o Stybar e o Vandenbergh supreenderam-me bastante, pensava que seria o Terpstra a fazer mais frente!! quanto ao Cancellara, é o mesmo de sempre, um Senhor, gostei do Vanmarcke e especialmente do Gaudin, porque é um prazer ver um ciclista a dar tanto espetáculo como ele.
ResponderEliminarSerá que nas Ardenas, Costa terá carta branca, perante o momento de forma de Quintana??
Obrigado pelos comentários.
ResponderEliminarAnónimo do 1º comentário, atenção à linguagem. Relativamente ao conteúdo... o Cancellara não estava disposto a ir tão rápido quanto o Vanmarcke, pois sabia que a discussão seria entre os dois. Não me pareceu que o Cancellara trabalhasse de menos, mas sim que o Vanmarcke trabalhou mais do que devia. Acusou a adrenalina de estar na discussão de uma prova mítica.
Luis Caldas e Nuno Miguel, depois da queda do Valverde na Catalunha, não me parece que apostar tudo nele seja a melhor opção. A Movistar deve dar liberdade ao Rui Costa e até mesmo ao Quintana. No caso do colombiano, mais para a Flèche Wallone e a Liége-Bastogne-Liége.
Anónimo do último comentário, o Quintana nunca correu as provas das Ardenas. Se o Rui Costa não tiver liberdade, penso que será para trabalhar para o Valverde, mas espero que não seja o caso.
Cumprimentos!
PS: mesmo que queiram manter o anonimato, é preferível que criem uma alcunha do que escrever como "Anónimo". Torna-se complicado responder a vários anónimos e especificar para quem é.
Gostei de ver... nunca tinha conseguido ver... em directo. Mas fiquei a pensar que os ciclistas deveriam evitar as bermas... algumas já estão alcatroadas e tudo. a corrida pode ficar a perder...
ResponderEliminarParabéns pelo blogue! Os amantes do ciclismo agradecem