sábado, 31 de maio de 2014

Giro 2014: A confirmação de um grande

Foi um Giro d'Itália de jovens. De Fabio Aru, Rafal Majka, Wilco Kelderman, Nacer Bouhanni e Michael  Matthews. Foi um Giro de colombianos, de Julián Arredondo e Rigoberto Urán. Mas foi sobretudo o Giro de Nairo Quintana, jovem de 24 anos, colombiano de Boyacá.

Quintana assumiu a liderança do Giro numa das etapas mais polémicas das grandes voltas dos últimos anos e o que se passou na descida do Stelvio não pode ser apagado. Uma mensagem confusa do rádio volta, que algumas equipas entenderam estar neutralizada, outras não entenderam assim. Daqui a meia dúzia de anos, quando recordamos este Giro, quando recordarmos a primeira prova de três semanas vencida por Quintana, não poderemos esquecer disso. Certo é que nenhuma regra do ciclismo diz que bandeiras vermelhas significam neutralização. E nenhuma diz que não podem ser ultrapassadas pelos ciclistas.

A partir daí, depois da confusão causada, para os organizadores do Giro interessavam duas situações. Ou que Quintana perdesse, ou que Quintana não deixasse qualquer dúvida sobre ser o mais forte. Aconteceu a segunda.

Na chegada ao Rifugio Panarotta, na quinta-feira, começaram-se a ver sinais de debilidade de alguns ciclistas até então a andarem de forma irrepreensível, como Kelderman ou Hesjedal. Também Cadel Evans, que aí perdia o pódio. Mas na crono-escalada de sexta-feira, mais do que as debilidades, viram-se as forças de cada um.

Era uma crono-escalada muito dura, com 27 de extensão, quase 20 a subir e quando o vencedor demora 65 minutos para o cumprir, não há dúvidas quanto à dureza. Nestas condições é muito mais escalada do que crono, mas ainda assim suficientemente crono para fazer grandes diferenças. Porque num contrarrelógio não há rodas a seguir, e é muito diferente impor o próprio ritmo do que seguir na roda. Naquele dia tinha, forçosamente, que vencer o melhor. E foi Quintana.

Fabio Aru disfarçou a monstruosidade que foi a prestação de Quintana, porque foi também ele extraterrestre. Quintana deixou o terceiro classificado quase a minuto e meio, Aru também deu mais de um minuto a Urán.

Relativamente a Aru foi a confirmação de um talento mas, sem dúvida, uma grande surpresa. Dele já se esperava que um dia brilhasse a este nível, mas não se pensou que fosse tão cedo. 24 anos para cumprir, menos cinco meses que Quintana. Rafal Majka será 6º também aos 24 anos (25 por cumprir ainda este ano) e Wilco Kelderman 7º dois meses depois de cumprir 23. Entre os sete primeiros, quatro ciclistas que contam para a classificação da juventude. Calculo que seja caso único em grandes voltas.

Três etapas e a classificação dos pontos para Nacer Bouhanni, uma etapa e seis dias de rosa para Michael Matthews, duas tiradas para Marcel Kittel, outras tantas para Diego Ulissi, três para a Bardiani. As atenções ficaram centradas em poucos protagonistas, enquanto as italianas Cannondale, Neri Sottoli e Androni saem de mãos a abanar. Foi, de resto, um Giro para países não-tradicionais. A camisola rosa começou num canadiano, passou por dois australianos e depois dois colombianos mas nunca europeus.

A subida ao Monte Zoncolan foi demasiado morna, como tantas vezes acontece neste tipo de subidas. O único ataque digno de nota foi de Robert Kiserlovski, porque os ciclistas estão demasiado concentrados em sobreviver às duríssimas inclinações e a uma centena de estúpidos que se encontram dispersos entre milhares de adeptos de ciclismo. Os verdadeiros adeptos de ciclismo ficam quietos a aplaudir e encorajar os ciclistas. Michael Rogers isolou-se para a vitória quando um desses otários empurrou Francesco Bongiorno.

Se para uns este é um momento importante no começo da carreira, para outros acontece o contrário. Cadel Evans será oitavo, Ivan Basso décimo quinto e ambos têm os seus melhores anos lá atrás. Michele Scarponi abandonou devido a vários problemas mas até aqui a sua temporada também estava distante do pretendido.

Pierre Rolland e Domenico Pozzovivo, quinto e sexto, foram dois dos ciclistas mais agressivos nesta prova e que mais a enriqueceram. Também Julián Arredondo, que teve o infortúnio de sofrer uma queda logo na primeira semana mas despede-se com a camisola da montanha e uma vitória de etapa. Rigoberto Urán, com uma etapa e o segundo lugar da geral pelo segundo ano consecutivo, mostra que não era um ciclista de eleição apenas na Sky.

Dario Cataldo, Thomas de Gendt, Tim Wellens, Franco Pellizotti ou Simon Geschke são alguns dos ciclistas que muito animaram a última semana.

André Cardoso, único português em prova, termina em 20º, depois de tanto cair na primeira semana e de ter trabalhado para Ryder Hesjedal a partir daí. Uma boa prestação do pequeno grande trepador português, que assim está a construir uma carreira segura no panorama internacional.

A chegada de amanhã a Trieste será para consegração de Nairo Quintana e, em princípio, vitória de um sprinter. Talvez a quarta de Bouhanni, ou a primeira de Giacomo Nizzolo (três segundos lugares e um terceiro até ao momento), ou de um outro, talvez jovem, talvez nem tanto. De um modo geral, assim foi a Volta a Itália 2014.

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Entretanto, na Colômbia...


A classificação da nossa liga no Velogames pode ser vista ao clicarem aqui. A luta pela vitória ainda está em aberto e para o Tour haverá mais. Com 113 participantes na primeira iniciativa que fazemos no Velogames, a liga foi um sucesso. Espero que se tenham divertido e que cheguem em forma ao Tour.

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Em Portugal, uma equipa ainda tem salários de 2013 para pagar e já leva vários meses de atraso relativamente a 2014 (e ainda estamos em maio). Os seus ciclistas ameaçam deixar de correr mas para já ficam mesmo pelas ameaças. Aliás, penso que nunca as concretizarão, porque sabem que necessitam de correr a Volta a Portugal para mostrar o seu valor e poderem dar um passo em frente na carreira, livrando-se do buraco em que estão metidos. Aos leitores habituais do Carro Vassoura não é necessário dizer qual é a equipa, porque esta situação vem sendo antecipada desde o final de 2013 neste espaço. Espaço pequeno e modesto. Talvez polémico mas certamente honesto.

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No próximo fim de semana inicia-se o Critérium du Dauphiné (8 a 15 de junho), segunda prova que serve de teste para o Tour, agora que a Volta à Romandia se está a tornar o primeiro (de 2011 a 2013, quem ganhou na Romandia repetiu no Tour). Não terá aqui antevisão porque desde há duas semanas que estão em preparação várias surpresas relativamente à Volta a França.

Já a partir desta semana, começarei a publicar aquele que espero ser o maior trabalho de antevisão de uma prova aqui feito até à data. Durante o próximo mês haverá várias novidades, coisas que nunca foram feitas no Carro Vassoura e que estou ansioso para as terminar e publicar.

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