domingo, 20 de setembro de 2015

As hipóteses de Portugal em Richmond

Iniciados estão os Mundiais de Richmond com as provas de contrarrelógio coletivo e já aí vêm as provas de seleções, primeiro com os contrarrelógios e depois com as provas de fundo, culminando com os elites, onde Portugal se representa com Rui Costa, Nelson Oliveira e José Gonçalves, trio que se apresenta em muito boa forma. Favoritismo por isso, não é o caso, pois Richmond não é a Florença de boas recordações.

A Portugal cabem este ano apenas três vagas para a principal prova dos Mundiais, metade de 2014, o que naturalmente se lamenta, mas os três escolhidos não parecem gerar qualquer contestação. Para fazer uma seleção, não se trata de premiar os três (ou seis, se fossem) melhores corredores nacionais, mas sim escolher aqueles que melhor podem render na prova em causa. Para o circuito deste ano, Rui Costa, Nelson Oliveira e José Gonçalves são os que melhor se adaptam às suas características, e felizmente todos se exibiram em muito boa forma no último mês. Posto isto, o selecionador fez a melhor escolha possível. Porém, ter três ciclistas em muito boa forma não implica qualquer favoritismo e, ainda que espere estar enganado, não creio que Portugal tenha mais do que reduzidíssimas hipóteses de vitória ou medalhas na prova de domingo.

Nelson Oliveira e José Gonçalves vêm de excelentes prestações na Vuelta à base daquilo que tão grande faz o ciclismo e aqui tanto elogio, que é a valentia, a bravura e a agressividade. Às vezes premiadas, tantas outras sem glória. Mas para ser campeão do mundo é preciso mais, não basta ser bom ou muito bom, é algo que está ao alcance de poucos.

Se nas grandes voltas as grandes equipas lutam pela classificação geral e poupam esforços para dias mais importantes, no Mundial todos lutam pelo mesmo e ninguém oferece etapas para serem disputadas por fugitivos. Assim, nas três grandes deste ano, mais de um terço dos triunfos foi para fugas formadas longe da meta, umas por descuido do pelotão e das equipas dos sprinters, muitas por benesse das formações mais fortes, porque nenhuma queria desgastar os seus homens na perseguição, ou porque nesse dia não tinham ninguém para discutir a etapa, porque assim são as grandes voltas. Os Mundiais não. Nos últimos quinze Campeonatos do Mundo de elites, apenas por uma vez a vitória foi para alguém que se escapou ao pelotão distante da meta, e foi porque todas as principais seleções estavam representadas nos grupo que daria o ouro a Alessandro Ballan (2008).

E, se não basta ser bom ou muito bom, ser excecional também pode não bastar, como atestam alguns dos melhores classicomanos da história deste desporto que nunca vestiram o arco-íris da prova de fundo, como De Vlaeminck, Kelly, se não quisermos recuar tanto Bartoli, Cancellara, Valverde.

Rui Costa já demonstrou que tem a capacidade e tudo mais o que é necessário para ser campeão do mundo, como a boa forma do terceiro posto em Montreal, mas se há prova em que méritos passados não são garantia de sucesso ou favoritismo na edição seguinte, essa é o Campeonato do Mundo. Todas as clássicas, de Sanremo à Lombardia, passando por Flandres, Roubaix ou Liège, Gent-Wevelgem ou Amstel Gold Race, sofrem alterações nos seus percursos, mas mantêm a sua identidade. São alterações ligeiras. Os Mundiais, mudando de circuito, país e continente, são todos diferentes entre si. E não basta ser bom, muito bom ou excecional, como é Rui Costa, Cavendish, Gilbert, Evans, Bettini ou Cipollini, é necessário que haja um percurso que se encaixe nas suas características.

A prova é a mesma, o arco-íris é o mesmo, mas Richmond não é Florença, como Copenhaga não era Mendrisio, ou como Estugarda não era Madrid e Hamilton não era Zolder. Cipollini não era favorito onde venceu Bettini, Evans onde venceu Hushovd, Cavendish não o era onde venceu Rui Costa.

Rui Costa foi campeão em condições excepcionais, num percurso que era considerado um dos mais duros dos últimos largos anos. Quando se fez a seleção que viria a originar a discussão das medalhas, já na última volta, ficaram apenas cinco corredores na frente: Costa, Nibali, Rodríguez, Valverde e Urán (que cairia depois). São cinco ciclistas de inquestionável qualidade e quatro deles com mais de um pódio em grandes voltas. Não restam dúvidas de que era um circuito duríssimo e cinco ciclistas com qualidade mas também com características para o disputarem, este, não qualquer um, da mesma forma que Olano e Pantani discutiram o Mundial de Duitama, Colômbia, mas nem antes nem depois tiveram qualquer outra hipótese de pensar em medalhas, porque as suas características não eram para isso.

Richmond é um circuito sem dificuldades de maior nota. Existem três rampas entre os 200 e os 400 metros de extensão, todas dentro dos cinco quilómetros finais. Além de curtas, permitem onze quilómetros para os corredores recuperarem integrados no pelotão, o que me faz antever um pelotão numeroso, com várias dezenas de corredores, até aos cinco quilómetros finais. E neste cenário, Portugal poderá colocar alguém a lutar por um posto qualquer, mas não tem ninguém para sprintar contra Kristoff, Degenkolb, Sagan, Matthews ou outros homens rápidos dos muitos presentes neste pelotão. Isto, em condições normais, que são aquelas em que há escaramuças mas com o pelotão organizado a anula-las porque não há dificuldades no circuito para desmembrar os blocos mais fortes e numeroso.

A distância fará mossa, as rampas ao cabo de 240 quilómetros fazem-se mais duras, mas é um circuito para para corredores rápidos, Doha (Qatar, 2016) também será, de Bergen (Noruega, 2017) ainda não se conhece o percurso mas provavelmente. Os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro sim terão um percurso muito duro.

Em Richmond resta a Portugal apostar nos caminhos alternativos, colocar corredores nas diversas movimentações e esperar que se forme um grupo com representantes das principais nações para que estas não trabalhem lá atrás, como em 2008. Nos últimos anos, apenas por uma vez aconteceu e antes disso é preciso recuar até ao primeiro triunfo de Freire em 99, mas nas tais "condições normais" não vejo Portugal a lutar pelas medalhas. As hipóteses dos ataques formados antes da última volta levarem a bom porto são escassas, mas ainda assim melhores para Portugal do que ir para o sprint com alguns dos melhores do mundo na matéria. Gostaria eu de estar errado e podia ser o pódio repleto de portugueses. Mas é melhor tomar uma dose de realismo, porque para vender ilusões, outros e experientes.

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Horário das transmissões na RTP 2:

Data
Hora
Prova
Domingo 20/09
16h30-18h15 (direto)
Contrarrelógio Equipas – Feminino
Domingo 20/09
18h20 – 21h10
Contrarrelógio Equipas – Masculino
Segunda 21/09
23h20
Contrarrelógio Individual Sub-23 – Masculino
Terça 22/09
23h20
Contrarrelógio Individual – Feminino
Quarta 23/09
19h30 – 21h00 (direto)
Contrarrelógio Individual – Masculino
Sexta 25/09
23h20
Estrada Sub-23 Masculino
Sábado 26/09
23h20
Estrada Feminino
Domingo 27/09
17h00 – 21h00 (direto)
Estrada Masculino

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