Poderia tentar escrever uma crónica super optimista, perspectivando muito espectáculo para a etapa de amanhã, mas tenho que ser sincero com o leitor: espero uma etapa chata, uma das mais chatas edições da chegada à Senhora da Graça nos últimos anos. Falta espaço para estratégia, pois montanha... só mesmo nos últimos 8 quilómetros.
Voltando 10 anos atrás, na Volta a Portugal de 2002, para chegarem a Mondim de Basto os ciclistas tinham que ultrapassar duas contagens de primeira categoria, uma de segunda e uma de terceiro, para só aí iniciarem a ascensão final. Durante os anos que se seguiram, não faltaram montanhas para anteceder a Senhora da Graça, destacando-se o Alto do Velão, Barragem do Alvão e o Monte do Viso, mas também a Portela de Santa Eulália, Alto do Marão, Alto do Carneiro, Caravernelha, Cumieira ou Lameira, entre outras. Certamente o leitor reconhecerá alguns destes nomes que animavam a etapa da Senhora da Graça desde o início, com as principais equipas a tentarem colocar homens em fuga para na parte final ajudarem os seus líderes, uma vez que as dificuldades prévias reduziam significativamente o grupo principal. Lembro-me especialmente da edição de 2006 e de 2008. Em 2006, a 100 km da meta, e com a Barragem do Alvão (1ª) e Monte do Viso (1ª) por ultrapassar antes da subida final, deu-se uma fuga numerosa, onde estavam João Cabreira, Héctor Guerra, Christian Pfannberger e Carlos Pinho, entre muitos outros, com o grupo principal a chegar com dois minutos de atraso. Já em 2008, com Rui Sousa de amarelo mas David Blanco em clara vantagem devido ao contra-relógio do última dia e pouco atraso para recuperar, a Liberty Seguros atacou em massa desde os primeiros quilómetros, com a Lameira (2ª) ultrapassada e Viso (1ª), Velão (1ª) e Caravernelhe (2ª) pela frente, com o próprio Rui Sousa, Koldo Gil e Isidro Nozal. O ataque não deu certo e Américo Silva foi bastante criticado, apesar de eu não concordar com as críticas, o que daria aqui pano para mangas. Certo é que Américo Silva arriscou, porque naquele dia havia espaço para isso, tal como ainda houve em 2009 e então correu bem à Liberty Seguros. O Nuno Ribeiro e mais uma dezena de corredores atacaram na penúltima subida do dia para aí distanciarem David Blanco e Ruben Plaza, que só recuperaram quando Nuno Ribeiro foi apanhado nas malhas do doping.
Em 2010 já faltou dificuldade prévia, cabendo a André Cardoso e David Blanco fazerem a diferença na ascensão final, enquanto no ano passado foi ainda pior, com apenas uma 4ª e uma 3ª categoria, ainda a 70 km da meta, e, claro, o pelotão a chegar a Mondim de Basto quase compacto. No final, poucas diferenças entre os favoritos.
Ricardo Mestre venceu recentemente no Troféu Joaquim Agostinho |
A Carmim tentará que a corrida chegue controlada a Mondim, perdendo o mínimo de homens e reservando Alejandro Marque, David Livramento e principalmente Nelson Vitorino para o apoio a Ricardo Mestre. A Efapel-Glassdrive tem David Blanco, Rui Sousa, Nuno Ribeiro, Ricardo Vilela e Sérgio Sousa para jogar antes, mas pouco adiantará lançar alguém antes da subida final. Mesmo achando que Blanco é o mais forte dentro da equipa (olhando para a Torre e para o contra-relógio), se eu fosse o director desportivo experimentaria lançar um dos outros homens logo no início da ascensão. É lançar o barro à parede. Se a Carmim se descuidar, um desses homens pode ganhar aí tempo, se não se descuidar (e não o costumam fazer), os outros continuarão poupados. O que me parece mal é, com tantos trepadores e teórico-trepadores, usa-los apenas para ir na roda ou atacar apenas um a 300 metros da meta.
Hugo Sabido, Vergílio Santos e Daniel Silva são outros três homens que espero que estejam bem. Talvez também José Mendes, que agora já não entra nas contas para a classificação geral e terá mais liberdade para procurar a vitória na etapa. Quanto aos estrangeiros, Brice Feillu (Saur-Sojasun), Darwin Atapuma (Colombia-Coldeportes), Garikoitz Bravo e David de la Cruz (Caja Rural) e Jordi Simon (Andalucia) parecem-me os mais fortes. Veremos também do que é capaz o recém-regressado ao profissionalismo Moisés Dueñas (Burgos), o João Cabreira depois de uma época tão fraca, a evolução do Bruno Silva, 16º na geral do ano passado, e o que consegue o José Gonçalves, que tão boa temporada tem realizado.
Notas soltas da Volta
Como esta é a primeira crónica que escrevo desde o arranque da Volta, aproveito para comentar sucintamente alguns acontecimentos destes primeiros dias:
- As queixas do Mário Rocha no prólogo fazem pouco sentido e os argumentos não fazem sentido nenhum. Convém também relembrar que a Volta a Portugal é a maior montra do ciclismo português, para adeptos, patrocinadores e possíveis patrocinadores, e a imagem que o Mário Rocha transmitiu foi péssima. Fez uma peixarada, passou a ideia de que o ciclismo é um desporto de batota fácil e duvido que os patrocinadores tenham gostado. Se não fosse director da empresa Antarte (2ª patrocinador), duvido muito que fosse director desportivo de alguma equipa.
- As queixas do Mário Rocha no prólogo fazem pouco sentido e os argumentos não fazem sentido nenhum. Convém também relembrar que a Volta a Portugal é a maior montra do ciclismo português, para adeptos, patrocinadores e possíveis patrocinadores, e a imagem que o Mário Rocha transmitiu foi péssima. Fez uma peixarada, passou a ideia de que o ciclismo é um desporto de batota fácil e duvido que os patrocinadores tenham gostado. Se não fosse director da empresa Antarte (2ª patrocinador), duvido muito que fosse director desportivo de alguma equipa.
- A Efapel-Glassdrive esteve muito bem ao assumir a perseguição da fuga na primeira etapa, até mesmo com o Sérgio Ribeiro, pois estava quase impossível chegarem ao homem da frente e, mais do que pensar na luta pelo 2º lugar, importava anular a desvantagem. Pelo contrário, a forma como deixaram o Sabido se escapar foi demasiado amadora, pois uma coisa é deixar passar na frente da meta volante, outra é dar tantos segundos.
- A movimentação do Hugo Sabido na primeira etapa foi bastante ousada e está de parabéns por isso.
- Já vi e ouvi bastantes críticas à LA/Antarte por não ter ajudado na perseguição na primeira etapa. Quanto a mim, não censuro, nem os ciclistas nem a equpa, pois o seu principal homem, José Mendes, tinha ficado para trás e, uma vez que não há comunicação rádio e os carros de apoio iam atrasados, os seus colegas não sabiam se estava atrasado 5 minutos ou se estava a 30 segundos e podia reentrar.
- Já vi e ouvi bastantes críticas à LA/Antarte por não ter ajudado na perseguição na primeira etapa. Quanto a mim, não censuro, nem os ciclistas nem a equpa, pois o seu principal homem, José Mendes, tinha ficado para trás e, uma vez que não há comunicação rádio e os carros de apoio iam atrasados, os seus colegas não sabiam se estava atrasado 5 minutos ou se estava a 30 segundos e podia reentrar.
- Segundo o repórter da mota RTP (Alexandre Santos), o director desportivo do Boavista terá dito ao David Gutierrez para ter cuidado com o colombiano Duber Quintero quando ia em fuga com este e o francês Cyril Bessy na segunda etapa. A partir daí, o David Gutiérrez limitou-se a andar atrás dos dois colegas de fuga que, por sua vez, começaram a temer o espanhol. Uma fuga que estava bem encaminhada para o sucesso, foi anulada em menos de nada. Moral da história: não contes com o ovo no cu da galinha.
- Já aqui referi várias vezes que o Carlos Pereira tem o mérito de assumir sempre a perseguição das fugas quando é necessário. Não olha para o lado à espera dos adversários como faziam Américo Silva e Manuel Zeferino. Hoje todos queriam poupar os seus ciclistas para a etapa de amanhã e, para não desgastar dois ou três na perseguição a uma fuga, a Efapel-Glassdrive intrometeu César Fonte entre os fugitivos. Moral da história: foi a única equipa que não teve que trabalhar no pelotão, só César Fonte se desgastou e como prémio venceram a etapa. Parabéns para o César Fonte, parabéns para o Carlos Pereira!
- Genericamente, as equipas estrangeiras têm estado muito activas e ainda bem. Por outro lado, pede-se mais agressividade às portuguesas, especialmente à LA, que não teve ninguém nas principais fugas destes três dias. A Onda também só teve numa das três e nas outras duas pouco ou nada fez. Convém lembrar que o Boavista não vence na Volta a Portugal desde 2006 ...
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Convido os leitores a passarem pelo site Visão Desportiva, onde vou escrevendo algumas crónicas (menores que aqui) sobre a Volta e posteriormente sobre a Vuelta. Convido também a aderirem à página do Facebook, que já ultrapassou os 200 fãs. Também no blog são cada vez mais leitores. Obrigado a todos!
Em relação à peixeirada do Mário Rocha dou-lhe razão numa coisa. Como é possível uma empresa afecta a um director desportivo de uma das equipas presentes na prova ser a responsável por cronometrar o tempo? Não há conflitos de interesse nisso? É que já não é o primeiro ano que acontece.
ResponderEliminarAntes de mais, obrigado pelo comentário, Luís.
EliminarÉ verdade que o material é da Fullsport, que pertence ao Carlos Pereira, mas a cronometragem é da responsabilidade dos comissários. Não vou estar em grandes pormenores correndo o risco de estar a falar mal, mas até onde sei, a cronometragem é da responsabilidade dos comissários. À parte disso, o Mário Rocha usou como argumento que a cronometragem oficial não coincidia com a da RTP, mas, como todos víamos, a cronometragem da RTP não era de fiar, pelo que o Mário Rocha devia ter respirado duas vezes e pensado no que ia dizer. Ainda por cima, o Mário Rocha não acusou o Carlos Pereira de manipulação para benefícios próprio, mas sim para prejuízo da LA. O que lucrava o Carlos Pereira com a vitória do sul-africano? Para o ciclismo português, até é melhor que vença um português e que a amarela esteja num português.
Bem-haja!
Hoje fiz de bicicleta a Senhora da Graça! ehehe :)
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