Não há dúvida quanto à força dos ciclistas que lutam pelos primeiros lugares do Tour, força física e psicológica, mas ao mesmo tempo são tão débeis quando o adversário é o azar. Que o diga Chris Froome, Tejay Van Garderen, Andrew Talansky ou muitos outros que experimentaram o alcatrão francês esta semana com mazelas físicas e desportivas. Nesse sentido, esta era (e ainda é) uma semana para salvar, e apesar de alguns azares, Rui Costa e Tiago Machado têm conseguido.
Os dois lusos com ambições na geral não estiveram totalmente isentos de azares. Ambos já foram ao chão. Rui Costa caiu no dia dos pavés, mas logo nos primeiros quilómetros, o que lhe permitiu recuperar e estar com os seus adversários no final. Tiago Machado caiu ontem com Van Garderen mas levantou-se mais rápido que o norte-americano e não perdeu tempo. O Tiago também ficou preso na queda de Van Den Broeck a 800 metros da meta, mas ficou com o tempo do vencedor. Rui Costa teve hoje um problema mecânico no começo da última subida e, apesar do sprint que fez, não conseguiu recolar antes do ataque de Alberto Contador. Perdeu tempo hoje, mais do que teria perdido se não fosse esse contratempo, mas como se costuma dizer, do mal o menos.
Rui Costa, oitavo na geral, continua com as suas aspirações ao top-10 intactas. No começo acreditava que poderia lutar pelos cinco primeiros lugares e, para já, acredito igualmente nesse cenário, ainda que o ciclista coloque a fasquia no top-10.
Tiago Machado é 20º na classificação, na sua estreia. Apesar dele não assumir uma meta para a classificação geral (podem ler À conversa com Tiago Machado), continuo a acreditar num resultado muito interessante para ele. Para terminar nos 20 primeiros não é necessário estar entre os vinte melhores de cada etapa. O Tour é uma prova que premeia a regularidade e a consistência.
Começa agora a ver-se como estão os homens que ambicionam os primeiros lugares da geral em Paris, que é quando verdadeiramente interessa. Jakob Fuglsang e Michal Kwiatkowski mostraram hoje como é diferente o esforço feito na quarta-feira nos pavés em relação ao de hoje nestas curtas mas inclinadas subidas. Passaram o exame da quinta etapa com distinção mas chumbaram no de hoje. E para as contas finais este é muito mais preponderante.
Sem aquele azar que o obrigou a acelerar precocemente, Rui Costa teria feito melhor hoje. Não com Contador e Nibali mas certamente alguns segundos melhor.
A sua equipa tem sido alvo de debate e de muitas análises, o que é normal. No Tour tudo tem um impacto e uma atenção ampliada. Sempre assim foi, mas sobretudo agora, com esta geração a colocar o ciclismo em estações de rádio e canais televisivos que não tinham o hábito de falar da modalidade. Ver o Tour no Jornal da Noite da SIC e ouvir falar dele pela manhã na Rádio Comercial ainda é uma surpresa.
Não era preciso chegar ao Tour para saber que a Lampre não é das equipas mais fortes. Além disso, Chris Horner em nada tem ajudado Rui Costa o que não me surpreende. Chris Horner tem um estatuto muito elevado e também um ego de dimensões consideráveis, o que é normal para quem venceu a Vuelta do ano passado. Parece-me que muitos dos adeptos que há um ano reclamavam por Rui Costa trabalhar para Alejandro Valverde e Nairo Quintana são os mesmos que agora reclamam por Chris Horner não trabalhar, o que de certa forma é incoerente.
Desde cedo a Lampre manifestou a sua aposta no campeão do mundo para atacar a classificação geral deste Tour, mas não está totalmente focada nesse objetivo, o que é percetível de várias formas. Niemiec, Cattaneo e Ulissi (agora suspenso, eu sei), três dos melhores trepadores da equipa foram escalonados para o Giro e não para o Tour. A presença de Modolo, Richeze e Cimolai, dois sprinters e um lançador, também demonstra a tentativa de diversificar a aposta da formação italiana, bem como a presença de Chris Horner que poderia ser um Plano B.
A Rui Costa nunca se o viu reclamar publicamente da atitude de um companheiro e também não o fará agora. Sabe que o caminho não é esse. A ele cabe-lhe mostrar que é capaz de fazer uma grande Volta a França, sobre o que não tenho dúvidas. Terminando este Tour em bom nível, ganhará peso e confiança dentro da Lampre, poderá ter uma voz mais ativa na construção do plantel e da equipa que o acompanhará nas principais provas. Com o que pagam a Horner, poderão ter dois ou três colegas de qualidade para ajudar Rui Costa na montanha, escolhidos pelo próprio e mais úteis, como tem sido Nelson Oliveira. Aliás, muito boa estreia do campeão nacional, muito útil para o seu chefe-de-fila até ao momento, num terreno que é o seu.
Alberto Contador, Vincenzo Nibali e Richie Porte foram os candidatos ao pódio mais fortes no final. Contador, fiel ao seu discurso de quem se acha imbatível, diz que o objetivo de hoje não era ganhar tempo a Nibali e que a sua equipa trabalhou apenas para ganhar tempo a outros "ciclistas bons e bem posicionados". A Tinkoff deve ter trabalhado para eliminar Sagan e Gallopin. Aliás, depois de Talansky vencer o Dauphiné, Contador disse que tinha sido vencido, não pelo seu adversário, mas "pelas circunstâncias de corrida". Contador e a sua enorme humildade. Nibali é de menos palavras.
Mas apesar dos segundos ganhos e perdidos - conforme a perspetiva - fosse ou não o objetivo, hoje apenas tivemos colinas. A etapa de amanhã tem um constante sobe e desce, mas será a jornada de segunda-feira a proporcionar a primeira etapa de montanha, com final em La Planche des Belles Filles (1ª cat).
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— Rui Quinta (@CarroVassoura) 30 junho 2014
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