sábado, 11 de outubro de 2014

Ninguém quer correr a Volta a Pequim

Vai uma voltinha de bicicleta?
A segunda etapa da Volta a Pequim foi reduzida em 35 quilómetros. A organização foi forçada a diminuir a etapa para 111 quilómetros de extensão de forma a evitar sérios problemas com os ciclistas, porque ninguém quer correr a Volta a Pequim.

Está é a última edição de uma prova criada em 2011 pela UCI, criada à imagem do que a UCI quer para o ciclismo. Ciclistas que não querem estar em Pequim, representam equipas que não querem estar em Pequim, patrocinadas por empresas sem interesses em Pequim, ou sequer na China. Mas são obrigadas, porque pertence ao World Tour.

O problema não é que a Volta a Pequim exista. O problema é a obrigação destas equipas em estarem presentes. Em relação a esta corrida tenho a mesma opinião que face aos Jogos Olímpicos, ou a qualquer evento desportivo. Desportistas de elite não deveriam ser obrigados a correr numa ditadura, num país no qual a população não tem liberdade para escolher quem lhe governa. Este tipo de eventos, manipulados pela comunicação social controlada pelo Estado, facilmente se convertem em propaganda política. E desportistas de elite também não deveriam, nunca, sem forçados a correr num ambiente como o que encontram em Pequim, onde tudo o que respiram é porcaria. Nos últimos dias, Pequim está em alerta laranja devido à condição do ar.

Depois da Vuelta, estando na liderança do World Tour, Alberto Contador, anunciou a sua presença na Lombardia e na Volta a Pequim para defender a posição. Alejandro Valverde também anunciou a presença nas duas provas, no seu caso para atacar o primeiro posto do WT. Mas na prova italiana Contador caiu, perdeu a liderança e esta ficou demasiado distante para ser recuperada em Pequim. Decidiu por isso não participar na corrida chinesa e, sem estar ameaçado, Valverde decidiu-se pelo mesmo caminho. De entre os dez melhores do Ranking World Tour, apenas uma está presente, Rui Costa, porque está diante de uma oportunidade histórica de ascender ao terceiro lugar. E se baixarmos a fasquia até ao 20º do World Tour, apenas mais um está presente, Daniel Martin, precisamente o vigésimo. A razão é clara: ninguém quer correr a Volta a Pequim.

A Volta a Pequim é organizada pela Global Cycling Promotion, empresa pertencente à União Ciclista Internacional e uma excelente oportunidade de colocar dinheiro nos bolsos de familiares e amigos de quem tem poder de decisão. Pelo mesmo motivo, a UCI tentou duas vezes organizar a Volta a Hangzhou, quarta maior cidade chinesa. Mas tanto em 2012 como em 2013 a prova foi cancelada.

O interesse despertado no público, equipara-se ao interesse despertado nos ciclistas: nenhum. Na meta de hoje havia mais staff das equipas do que público propriamente dito e a alteração do local de chegada não justifica a ausência na sua totalidade. Onde as pessoas gostam de ciclismo, juntam-se nas contagens de montanha. Não foi o que se viu hoje. A um quilómetro do topo da contagem de montanha (que se tornaria em final de etapa) havia uma pequena aldeia e lá havia gente. O ciclismo é o desporto que vai à porta das pessoas e nada melhor do que essa frase feita explica o último quilómetro da tirada de hoje. Saíram de casa para ver o que lhes estava a passar à porta, mas foram incapazes de percorrer um quilómetro para ver o final, ou a contagem de montanha. Ao longo dos últimos mil metros não havia quase ninguém, e o pouco que havia eram fotógrafos e pessoal das equipas.

No final, a UCI venderá o evento como um sucesso e uma das provas World Tour com maior audiência. Mas isso não quer dizer que os chineses se importem com a Volta a Pequim ou com o ciclismo. A audiência da prova é grande porque contabilizada os milhões de chineses que veem um minuto de resumo no "telejornal" local.

Se o percurso original se mantiver, com a chegada em alto de segunda-feira, Rui Costa tem uma boa oportunidade de vencer a classificação geral. Se o fizer, será o último vencedor da Volta a Pequim, que em 2015 já não se realizará.

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