Arnaud Démare venceu em Sanremo e quebrou o jejum dos franceses! Desde 1995 que não venciam a prova italiana, então através de Laurent Jalabert. E desde 1997 que não venciam nenhum Monumento, então também através de Jalabert, na Lombardia.
Pode o adepto mais inexperiente pensar que nada se passa na Milano-Sanremo, a clássica plana, a clássica dos sprinters. Mas ao cabo de 300 quilómetros há sempre algo que faz valer a pena e este ano ultrapassou-se a marca das três centenas oficiais. Aos 291 oficiais previstos já havia que acrescentar 9 entre a partida simbólica e a partida real, mas este ano, devido a um deslizamento de terras, o percurso teve que ser alterado depois do Passo del Turchino e acrescentados mais nove quilómetros. Foram por isso 309 desde que os ciclistas saíram da mais populosa cidade italiana até chegarem a Sanremo.
A Classicissima não tem montanha, não tem colinas, mas tem o seu espetáculo muito próprio. Como disse o poeta "quando as crianças começam a andar de bicicleta o que mais destacam é quão longe foram e só posteriormente a dureza do percurso, as subidas ou outros detalhes. Ir o mais longe possível está na essência do ciclismo" (Sergio, 2016).
A corrida teve os seus previsíveis ataques, de imprevisíveis consequências. Na Cipressa e nos quilómetros planos que ligam o final da sua descida até ao início da ascensão ao Poggio di Sanremo.
Quando a última subida se iniciou, também as quedas já tinham feito vítimas, sendo a mais destacada do vice-campeão mundial Michael Matthews. Mesmo resistindo no grupo, encontrava-se mais desgastado do que aconteceria em condições normais.
A ascensão fez-se com grande hesitação quase até ao seu final, quando surgiram ataques de ciclistas que tinham hipóteses de vencer sim, mas para isso precisavam de romper a corrida, como Gallopin, Kwiatkowski e Nibali. Bom, atacaram três que atacam sempre e atacam com tudo o que têm, seja ou não o suficiente para vencer.
Kwiatkowski terminou a descida isolado, altura em que atacou Cancellara, outro da mesma espécie. E repare-se o que Cancellara arranca muito forte, apanha Kwiatkowski e não sabe mais nada. Demora quase meio quilómetro até que olha para trás para ver se alguém seguia, porque sabia que a sua oportunidade de vencer estava ali e tinha que a jogar sem hesitar. Não foi o suficiente. Na roda seguia um homem da Etixx que não colaborou (estavam muitos da equipa belga no primeiro grupo) e atrás o que restava do pelotão conseguiu anular o suíço.
Com tantas acelerações depois de tantos quilómetros de esforço, poucos resistiam no grupo que discutia a vitória, e a 300m da meta o então principal favorito caiu, sozinho. Fernando Gaviria, com 21 anos, na sua estreia, estava a 300m do risco com excelentes possibilidades de vencer o primeiro Monumento da temporada. Cortou a meta em lágrimas de frustração mas pode olhar para o futuro com um sorriso de alegria.
Foi Arnaud Démare quem venceu, aos 24 anos, quebrando o longo jejum dos franceses. Ele que sempre disse que o seu objetivo eram as clássicas, que sonhava com elas, que queriam vencer Sanremo, Flandres ou Roubaix, que várias vezes viu o azar bater-lhe à porta. Como hoje. Quando se viu afetado por uma queda no começo da subida para Cipressa. Recuperou, para o pelotão e para a vitória.
Ben Swift foi segundo e Jurgen Roelandts terceiro, um ciclista low-profile, que sabe dar tudo de si para os companheiros durante quase toda a temporada mas também aproveitar as oportunidades que lhe são concedidas. Já tinha sido terceiro na Volta a Flandres em 2013. Quarto Nacer Bouhanni, cuja corrente da sua bicicleta saltou já no sprint final, afetando a sua classificação. Talvez Démare e Bouhanni não fossem mesmo compatíveis na FDJ, mas o ciclismo francês ganha em ter os seus dois melhores sprinters livres, a FDJ ganha com Démare, a Cofidis ganha com Bouhanni.
Para a semana, Gent-Wevelgem, depois Volta a Flandres e Paris-Roubaix. Uma em cada domingo. Estamos na melhor fase da temporada.
Sem comentários:
Enviar um comentário